Pouco importa estar em Nova York, na zona rural da Alemanha ou em Hong Kong. É melhor pensar duas vezes antes de criticar o presidente da China, Xi Jinping. Nos últimos dias, dissidentes chineses nos Estados Unidos e na Alemanha disseram que parentes próximos que ficaram na China foram levados pela polícia, como parte de uma crescente caçada aos autores de uma misteriosa carta que pede a renúncia de Xi Jinping.
A carta, publicada num site ligado ao governo e assinada por “membros leais do Partido Comunista”, claramente atingiu um nervo: também há relatos de que cerca de uma dúzia de funcionários do site e de uma companhia de tecnologia relacionada tenham sido detidos.
No domingo (27), o colunista Chang Ping, que vive na Alemanha, escreveu que a polícia deteve seus dois irmãos e uma irmã na província de Sichuan. As autoridades, conta, pediram aos seus parentes que entrassem em contato com ele e exigissem que cessasse os artigos críticos ao Partido Comunista Chinês (PCC), especialmente um texto publicado pelo “Deutsche Welle” sobre a carta.
Na sexta-feira (25), o blogueiro Wen Yunchao, baseado em Nova York e conhecido como Bei Feng, afirmou que seu irmão e outros parentes também foram levados na província de Guangdong, após ele tuitar o link da carta.
O incidente demonstra como os serviços de segurança da China estão determinados a silenciar críticos — mesmo os que vivem fora do país — especialmente se escreverem em chinês e mirarem no cada vez mais autocrático presidente. Também mostra o quão sensível o partido se tornou a debates sobre rupturas internas.
O caso dos livreiros desaparecidos
A onda de detenções se segue ao desaparecimento, no ano passado, de cinco livreiros de Hong Kong, incluindo um cidadão britânico e um cidadão sueco desaparecido na Tailândia. O “crime” seria a publicação de livros críticos a figuras do partido, incluindo Xi Jinping, e a alegada exportação desses livros proibidos para a China continental.
Os livreiros foram efetivamente silenciados. O britânico Lee Bo reapareceu em Hong Kong na semana passada, após mais de dois meses na China continental, e foi citado por um site chinês dizendo que nunca mais teria uma livraria ou venderia livros “fabricados”.
O sueco Gui Minhai foi apresentado na televisão estatal fazendo uma confissão aparentemente forçada sobre um caso de dirigir embriagado de uma década atrás. No domingo, o “South China Morning Post” reportou que o aeroporto de Hong Kong planeja cortar o número de livrarias nos terminais, eliminando a cadeia Page One, com base em Cingapura, e trazendo a rede Chung Hwa, da China continental.
Os escritores, no entanto, devem ser mais difíceis de silenciar. Chang, cujo nome real é Zhang Ping, tinha uma reconhecida carreira como jornalista e editor na China antes de ser rebaixado e, finalmente, demitido do jornal “Southern Metropolis Weekly“, em 2011, por trabalho considerado “inapropriado”. Em artigo no site China Change, baseado nos EUA, Chang condenou fortemente os “sequestros bárbaros” de seus parentes e tentativas do PCC de influenciar a mídia estrangeira.
“Eu sempre fiz o que acho correto e sempre estive disposto a aceitar o que o destino trouxer como resultado disso”, escreveu Chang. “O assédio e as ameaças das autoridades me permitem ver ainda mais valor nos meus escritos e me incentivam a trabalhar ainda mais duro no futuro”.