Apoiadores de “Baby Doc” fazem buzinaço em Porto Príncipe: ex-ditador ainda tem popularidade, mas é incerto se o apoio é grande o suficiente para forçar uma nova eleição| Foto: Lee Celano/Reuters

Tira-dúvida

Entenda o que pode ter motivado a volta de "Baby Doc" para o Haiti e como foi a recepção da população a sua chegada:

Por que ele voltou?

Ninguém sabe ao certo. Ontem, seu advogado disse que "Baby Doc" tem intenções políticas. No dia em que chegou, ele havia dito justamente o contrário: que não tinha qualquer pretensão política e estava no país apenas para "ajudar na reconstrução". Depois de 25 anos de exílio na França, morando inclusive na Riviera, o ex-ditador acabou liquidando sua fortuna. Nos últimos anos, vivia num apartamento pequeno, com a ajuda de apoiadores haitianos que moram na França, inclusive motoristas de táxi e garçonetes. Pelo estado físico apresentado, especula-se que ele pode estar com alguma doença terminal e tenha voltado simplesmente para morrer. Outra teoria é de que ele voltou a convite de René Préval, o atual presidente, como forma de distrair a população do caos que está o país hoje. Publicamente, porém, os aliados de Duvalier afirmam que Préval está perseguindo o ex-ditador.

Ele pode ser preso?

Sim, mas a grande questão é: quem vai processá-lo e prendê-lo? Desde o fim do ano passado, o Haiti está praticamente sem controle político, quando o segundo-turno das eleições foi cancelado. Teme-se que o país simplesmente não tenha a capacidade e a infraestrutura necessária para julgá-lo. De qualquer forma, esta é a primeira vez em que ele é acusado formalmente de corrupção, e há um forte lobby de organismos internacionais para que ele pague pelos crimes cometidos durante ditadura. A legislação do país deixa claro que não há qualquer impedimento para a instauração de um processo contra ele. Seu advogado, porém, afirmam que os crimes, se de fator ocorreram, já prescreveram.

Ele tem apoio popular?

Sim, "Baby Doc" goza de algum apoio popular, mas é incerto se o apoio é grande o suficiente para colocá-lo novamente no poder. A população haitinana é demograficamente jovem o suficiente para não lembrar dos anos da ditadura. Quem viveu sob seu governo lembra que as condições eram melhores do que as atuais, outro fator que pesa a favor do ex-ditador. Desde que chegou, o país registrou algumas manifestações pró-Duvalier.

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OEA

"País deve punir ex-ditador"

O Haiti deve punir os crimes cometidos durante a ditadura de Jean-Claude "Baby Doc" Duvalier, até agora impunes, afirmou ontem a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Duvalier, expulso em revolta popular em 1986, é apontado por organizações internacionais de direitos humanos como responsável pela morte de milhares de opositores durante o seu governo.

A CIDH lembrou ao governo do Haiti "seu dever permanente de investigar, processar, sancionar e reparar as violações de direitos humanos que constituem crimes contra o direito nacional ou internacional" em um comunicado".

Duvalier, que voltou no domingo ao Haiti no meio de uma crise eleitoral, foi acusado na última terça-feira de corrupção e de desvios de fundos públicos, e recebeu ontem quatro alegações de haitianos de que foram torturados, exilados e presos durante seus quinze anos no poder.

Segundo a CIDH, o regime de Duvalier, que governou com mão de ferro até 1986, foi "caracterizado por violações massivas de direitos humanos".

A Comissão, entidade autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA), disse que "não tem conhecimentos de qualquer investigação completa e castigo" contra os violadores de direitos humanos durante o regime de "Baby Doc".

A CIDH lembrou que em dezembro de 1979 publicou um relatório após uma visita ao Haiti, em que denunciava várias violações aos direitos humanos e das liberdades civis e políticas no país.

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Porto Princípe - O ex-ditador Jean-Claude Du­­valier, o "Baby Doc", espera ser eleito presidente do Haiti, afirmou ontem seu porta-voz. Hen­ri-Robert Sterlin, ex-embaixador do Haiti em Paris, explicou que a volta de Duvalier ao Haiti tem como objetivo a organização de uma nova eleição presidencial. A votação de 28 de novembro passado é alvo de contestações e o segundo-turno, que deveria ter ocorrido em janeiro, foi postergada. "Precisamos agitar as coisas de maneira que as eleições sejam anuladas e novas eleições organizadas para que Duvalier possa concorrer", afirmou Ster­­lin, em entrevista à agência de notícias francesa AFP.

A volta de Duvalier ocorre num momento em que o Haiti ainda vive uma grave crise hu­­manitária e política, um ano após o terremoto que deixou cerca de 230 mil mortos.

Em reação à declaração do por­­ta-voz de "Baby Doc", o Con­­selho Eleitoral Provisório do Haiti (CEP) informou que não pretende alterar os resultados do primeiro turno da eleição presidencial, publicados em 7 de de­­zembro. A decisão foi tomada com base no conselho de observadores internacionais.

Quatro haitianos entraram com quatro processos ontem contra Duvalier por tortura, exílio e prisões arbitrárias, cometidos durante os 15 anos em que ele passou à frente do poder.

Na terça-feira, as autoridades haitianas já haviam indiciado "Baby Doc" por corrupção e desvio de fundos públicos. Ele teria saqueado o Tesouro do país antes de fugir em 1986. Um juiz de instrução decidirá se existem provas suficientes para que Duvalier seja julgado. O processo poderá levar três meses. O sistema judiciário do Haiti permitiria que "Ba­­by Doc" ficasse preso até o juiz decidir se ele seria julgado, mas ele recebeu permissão para voltar ao Hotel Karibe, onde está hospedado com sua mulher na capital haitiana.

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"Para sempre"

"Ele ficará no Haiti para sempre, é sua história. E tomar parte na política, isso é certo. Um político nunca morre", disse ontem o advogado de Duvalier, Rey­­nold Georges, que argumenta que as acusações contra seu cliente já foram prescritas. "Nós não podemos voltar a essas coisas, é proibido pela lei", afirmou Georges. "É perseguição", acrescentou ele, afirmando que o presidente René Préval está por trás das acusações contra Duvalier. Préval, quando jo­­vem, foi um militante contra a ditadura da família Du­­valier.

Na segunda-feira, a mulher de "Baby Doc", Veronique Roy, dis­­se que o casal planejava re­­gressar a Paris em três dias. "Se ele tiver que deixar o país, ele pe­­dirá aos juízes e viajará", disse Charles.

Mais da metade da população nasceu após a queda de "Baby Doc" em 1986, evento que significou o final da dinastia Duvalier, que começou com a ditadura do seu pai, François Duvalier (1957-1971), o "Papa Doc". Durante a ditadura da família Duvalier, mi­­lhares de haitianos foram mortos pelo governo e outros milhares se refugiaram.

"Se Justiça de verdade deverá ser feita no Haiti, as autoridades haitianas precisam abrir uma investigação criminal sobre a responsabilidade de Duvalier na enorme quantidade de abusos aos direitos humanos cometidas durante sua ditadura, incluindo tortura, prisões arbitrárias, estupros e execuções extrajudiciais", afirmou a Anistia Internacional, em nota.

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