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Bolívia quer afastar EUA do combate à cocaína

Indígena segura folhas de coca em suas mãos: tribos utilizam erva para chás ou moscada, e para o combate a fome ou males da altitude | David Mercado / Reuters
Indígena segura folhas de coca em suas mãos: tribos utilizam erva para chás ou moscada, e para o combate a fome ou males da altitude (Foto: David Mercado / Reuters)

Frustrado com a maneira como os EUA gastam dinheiro no combate à produção de cocaína na Bolívia, o governo de Evo Morales decidiu assumir a tarefa, disse nesta terça-feira (12) o "czar" antidrogas boliviano.

"Estamos planejando nacionalizar a guerra contra o tráfico", disse Felipe Cáceres à Reuters. "Ainda vamos dar as boas-vindas à cooperação no futuro, mas o governo boliviano vai decidir como esse dinheiro será gasto".

"É uma questão de soberania, dignidade", acrescentou Cáceres, vice-ministro de Defesa Social e Substâncias Controladas.

Assim como Morales, Cáceres é dono de uma lavoura de coca, planta que, além de ser matéria-prima da cocaína, é usada por indígenas locais para fins tradicionais, como chá ou mascada, para combater a fome e os males da altitude, por exemplo.

A Bolívia é o terceiro maior produtor mundial de cocaína, atrás de Colômbia e Peru, e só neste ano os EUA já destinaram cerca de 25 milhões de dólares ao combate às drogas. Washington também financia programas para estimular produtores de coca a substituirem a planta por outros cultivos, como banana, críticos e café.

"A política do governo dos EUA faz com que, de todo o dinheiro que deveria ser destinado para melhorar as condições dos cocaleiros, 85 por cento vá para veículos, salários. Eles vivem em hotéis com piscina; [o dinheiro] vai para o bolso deles", acusou Cáceres.

"Não estamos rejeitando a ajuda dos EUA. Mas a ajuda não está indo para os cocaleiros, que estão preparados para produzir outros produtos e deixar a folha de coca para trás. No momento, a cooperação dos EUA é autônoma. Queremos reverter essa situação".

Cáceres disse que o governo esquerdista de Morales busca outros parceiros, como a Rússia, para fornecer helicópteros e outros equipamentos.

Em visita à Bolívia, David T. Johnson, do Departamento de Narcóticos e Assuntos Jurídicos Internacionais dos EUA, elogiou "a idéia de que as autoridades bolivianas estejam dispostas e sejam capazes de colocar verbas da Bolívia para também lidar com essa questão".

"Nossos dados mostram que aproximadamente 88 por cento do nosso financiamento vai diretamente para assistir as autoridades bolivianas e no trabalho de tratar das questões de combate aos narcóticos", afirmou.

Morales adota uma política de "zero cocaína, mas não zero coca", o que permite que dezenas de milhares de pequenos agricultores cultivem a folha para fins legais -- uma prática que os EUA consideram "permissiva".

Segundo a ONU, a Bolívia autoriza o cultivo de 12 mil hectares de coca para fins tradicionais, mas a produção se espalha por 29 mil hectares e atinge 104 toneladas por ano. Em meados da década de 1990, a produção chegava a 48,6 mil hectares, segundo Cáceres. Hoje em dia, na estimativa dele, 65 por cento do total é para fins legais e tradicionais.

Ele afirma que a demanda por cocaína cresceu, especialmente na América Latina e na Europa, mas que grande parte da cocaína confiscada na Bolívia está em trânsito do Peru para o Brasil, os EUA e a Europa.

A coca é onipresente na Bolívia. É vendida na rua por mulheres indígenas de chapéu-coco e mantas coloridas. Indígenas dos Andes costumam manter um rolinho de folhas dentro da boca, como quem masca fumo. Xamãs usam a planta para fins divinatórios. No prédio onde fica o gabinete de Cáceres há fotos das escuras folhas de coca e um cartaz anunciando um festival da coca.

O funcionário acha que um dia a Bolívia exportará coca legalmente. "Há 14 alcalóides na folha de coca. Só um deles é cocaína. Se tirarmos a cocaína da coca, podemos exportá-la. Esse é o plano."

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