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No fundo de um pequeno restaurante, no centro do município de Coroico, oeste da Bolívia, um homem de cabelos pretos e pele branca senta sozinho numa mesa. Começa a puxar assunto com todas as pessoas à sua volta, mas ninguém presta atenção. "Ele votou contra Evo. É anti-Morales e aqui todo mundo o detesta", conta-me no ouvido Glória Mamani Poma, filha de plantadores de coca e descendente dos índios aymara. Em Coroico, assim como em muitas outras regiões onde a população vive do plantio e da venda da folha de coca, ser contra o governo do primeiro presidente indígena cocaleiro da Bolívia é uma agressão.

As mil pessoas que vivem no povoado de Cruz Loma, a poucos quilômetros de Coroico, votaram por Morales no referendo revogatório deste domingo (10), afirmou o sub-prefeito Bernabé Mamani. "Ontem festejamos até o amanhecer a vitória de nosso presidente", disse. Os resquícios da festa podiam mesmo ser vistos pela região. Em apenas três horas, pelo menos dez bêbados tentaram parar o carro da reportagem para pedir carona ou para dizer que "estavam felizes".

Segundo o secretário-geral do sindicato dos cocaleiros do povoado, que concedeu a entrevista no bar ainda com um copo de pinga na mão, a festa é merecida, já que "o povo mostrou que quer mudar, que quer nosso líder no governo". Ramiro Calle contou que desde que Morales chegou à Presidência, tudo mudou na vida deles. "Antes a coca era muito barata e, às vezes, até proibida. Hoje o preço quase dobrou e nos sentimos valorizados."

Ao sair de La Paz em direção à Coroico, o caminho de montanhas é todo marcado com pichações e cartazes pró-Morales. Nos povoados próximos é difícil encontrar uma só casa que não tenha algo que se refira ao presidente. A bandeira da Bolívia também é marca registrada de qualquer bar, restaurante ou mesmo moradia.

Sem coca não há vida

As plantações de coca nesta região são de pequenos produtores que mantêm a produção com o trabalho de toda a família. Glória Poma explica que depois que Morales chegou ao poder a renda de sua família melhorou muito. "O preço da coca subiu demais, ficou valorizada, podemos exportar. E ainda há o programa Renda Dignidade, em que cada pessoa com mais de 65 anos recebe 200 bolivianos ao mês [o equivalente a R$ 46]."

Enquanto trabalha colhendo coca na plantação de sua família, Mercedes Zkuezu, de 53 anos, explica que antes era difícil viver só com o plantio. "O saco custava cerca de 30 bolivianos [cerca de R$ 6,9] na minha época! Evo é cocaleiro, entende o que passamos. E ele ainda tem suas plantações."

Para ela, assim como para a maioria das pessoas de Coroico, a coca é o único meio de subsistência possível. Como disse Zkuezu, depois de reclamar da dor nas costas por ficar oito horas agachada colhendo a folha: "A coca é nosso alimento, nos mantêm. Sem coca não há vida".

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