Entrevista: A mudança apenas começou
Autor do livro Dalit Phobia: Why Do They Hate Us? (Dalitfobia, por que eles nos odeiam?), Chandra Bhan Prasad nasceu em uma comunidade de artesãos que lidam com artigos feitos de couro de animais, os chamar, no estado de Uttar Pradesh. Tradicionalmente, na Índia, quem lida com carcaça de animais, com lixo, e com limpeza de latrinas é considerado "impuro". Daí serem ocupações reservadas a indianos que estão fora do milenar sistema de castas hindus. Antigamente eram chamados de "intocáveis".
Nova Délhi - O ato de limpeza e purificação de um templo hindu em homenagem ao deus Shiva virou caso de polícia há duas semanas. Motivo: recebeu a visita de uma fiel dalit (antigamente chamados de "intocáveis").
Pramila Mallick, integrante do primeiro escalão do governo da região de Orissa, não imaginava que sua prece e suas oferendas ao deus hindu Shiva fossem causar tanta polêmica e virar um escândalo. Assim que ela deixou o local, os sacerdotes brâmanes, da mais alta casta, fecharam as portas do templo, jogaram fora todas as oferendas dadas pela dalit, mudaram as vestes dos ídolos que ela tocou e lavaram o chão que ela pisou.
A discriminação por castas é proibida desde 1955, mas, na prática, continua. Rajni Tilak, ativista dalit, explica que as leis mudaram, mas a mentalidade dos indianos não acompanhou essa mudança. Segundo a ativista, há um esforço político para acabar com a discriminação, e financeiramente os dalits começam a avançar, mas o preconceito é muito arraigado e é mais difícil de ser eliminado na esfera social.
Quase um em cinco indianos pertence ao grupo dos "intocáveis". Eles somam cerca de 170 milhões de pessoas, ou 16% da população indiana, bem mais do que os chamados indianos de castas altas (que não passam de 8%). A maioria da população é formada por indianos de castas intermediárias. "Há muitos casos de dalits agredidos em vilarejos do interior porque estão vestindo roupas novas e modernas", diz.
Histórias de amor (como a que a novela Caminho das Indias vem mostrando) frequentemente acabam em tragédia.
Um exemplo que ficou conhecido em todo o país foi a história de Surjit Singh, um garoto dalits de 16 anos, trucidado em meados do ano passado no vilarejo de Una, no estado de Himachal Pradesh. Ele foi espancado por um professor porque escreveu um poema de amor para uma menina de casta alta. Muito machucado, no dia seguinte ele foi espancado de novo pela família da menina e acabou morrendo.
Os ativistas em defesa dos dalits alertam que os casos de violência que têm se tornado mais comuns ultimamente são a reação das castas altas à ascensão dos "intocáveis". Os exemplos nos seus arquivos de casos de agressões são inúmeros.
A festa de casamento do casal dalit Rekha e Harkesh, no ano passado, acabou nas páginas dos jornais pelo motivo errado. O cortejo da festa desfilava pelas ruas do distrito de Ballabhgarh, no estado de Haryana, com vários carros e até uma carruagem puxada por um cavalo. Bem ao estilo tradicional dos casamentos indianos. Mas por ser um casamento de dalits, e o noivo ter ousado seguir o cortejo levado por um cavalo que simboliza poder e riqueza , a festa acabou em pancadaria: um grupo de indianos de castas altas os atacou com pedaços de pau.
Na noite de 16 de junho de 2008, Sahebrao Jondhale voltava para casa com sua caminhonete Tata Sumo quando foi obrigado a parar por um grupo de homens que jogaram querosene e atearam fogo no veículo. Jondhale que vivia no vilarejo de Karanjala, no estado de Maharashtra tinha comprado a caminhonete com o dinheiro que havia economizado em 15 anos de trabalho na maior metrópole da Índia, Mumbai. Segundo seus familiares, o crime foi encomendado por pessoas de castas altas do vilarejo, que se sentiam ofendidas ao verem um dalit ganhando mais dinheiro do que eles.
Ganpatrao Bhise, da ONG Samajik Nyaya Andolan, de defesa dos dalits, diz que esse tipo de crime é cada vez mais comum e a polícia frequentemente alega que trata-se de "disputa de bens".