Milhares de manifestantes marcharam neste sábado pelas ruas de Copenhague em protesto contra a escalada do aquecimento global| Foto: Christian Charisius/Reuters

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Esboço de declaração final prevê redução de gases em mais de 50%

O mundo deve reduzir ao menos à metade as suas emissões de gases do efeito estufa até 2050, em comparação aos níveis de 1990, e os países ricos devem liderar esse processo, segundo o primeiro esboço da declaração final da conferência do clima de Copenhague, divulgado na sexta-feira. O documento de sete páginas omite cifras relativas a quantos bilhões de dólares os países ricos devem dar aos países em desenvolvimento para ajudá-los a mudar para energias verdes e enfrentar o impacto do aquecimento global, como a desertificação e a elevação dos níveis do mar.

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Brasil, China e outras economias emergentes devem receber ajuda financeira dos países desenvolvidos para reduzir suas emissões? Ou têm condições – talvez obrigação – de fazer isso com recursos próprios? Esse foi um dos temas que mais movimentaram a primeira semana de negociações na Conferência do Clima de Copenhague. As respostas dividem opiniões de especialistas brasileiros ouvidos pela reportagem.

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Para o físico José Goldemberg, da Universidade de São Paulo (USP), o argumento apresentado pelos Estados Unidos e pela União Europeia – de que os recursos deveriam fluir apenas para os países mais pobres – "tem uma certa lógica". "A China tem US$ 2 trilhões em reserva; é um país que lança foguetes ao espaço, que tem submarinos nucleares. Será que precisa mesmo de dinheiro para combater o aquecimento global?", questiona o físico.

O Brasil não tem foguetes nem submarinos nucleares, mas também tem condições de bancar suas ações, segundo ele. "Acho que as grandes economias não precisariam receber dinheiro, a não ser como uma ajuda complementar", diz Goldemberg. "Temos de fazer o trabalho dentro de casa."

Ele ressalta que muitas das ações necessárias para reduzir emissões são de natureza regulatória, que não requerem investimento público. Por exemplo: exigir padrões de maior eficiência energética na indústria. "Os países mais pobres não têm essa facilidade", diz.

A Convenção do Clima das Nações Unidas determina que os países desenvolvidos têm obrigação de financiar ações de mitigação (redução de emissões) e adaptação dos países em desenvolvimento aos efeitos das mudanças climáticas. A regra parte do princípio de que as nações industrializadas são as maiores responsáveis pelo acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera e, portanto, têm maior obrigação de resolver o problema e ajudar o resto do mundo a lidar com ele.

A Convenção foi assinada em 1992, no Rio de Janeiro, e os países foram divididos em grupos chamados Anexo 1 (desenvolvidos, como EUA, Canadá, Rússia, Austrália, Japão e europeus) e não Anexo 1 (em desenvolvimento, que inclui todo o resto do mundo).

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O problema é que alguns países, como Brasil, China, Índia, México e África do Sul (agora chamados "emergentes"), cresceram muito economicamente desde então. Tanto que as nações ricas se recusam agora a repassar dinheiro para eles.

"A estrutura da Convenção ficou um pouco congelada nesse mundo de 1992", avalia Roberto Schaeffer, especialista em planejamento energético da Coppe, Universidade Federal do Rio de Janeiro. "Mas muita coisa mudou de lá para cá."

Antes de cobrar recursos dos países ricos, segundo ele, o Brasil precisa calcular quanto vai custar para cumprir sua meta de reduzir em até 39% a curva de crescimento de suas emissões até 2020. "A discussão depende desse valor", diz Schaeffer. "Se o custo for muito alto e o Brasil não tiver condições de bancar, talvez precise receber recursos. Talvez não."

Para Tasso Azevedo, do Ministério do Meio Ambiente, a ajuda financeira aos países em desenvolvimento é "uma questão de justiça". "Podemos até ter condições de custear a meta, mas é uma conta que deve rachada por todos", diz. Segundo ele, o Brasil se compromete a cumprir sua meta sem recursos externos, "mas poderá fazer isso mais rapidamente" se tiver ajuda de outros países.

Jacques Marcovitch, da USP, especialista em economia do clima, faz um raciocínio semelhante. "A questão agora é de velocidade", diz. "Podemos atingir a meta com recursos próprios? Sim. Mas a que ritmo?" Ele lembra que quanto mais rápido os países emergentes – que já emitem quase tanto carbono quanto os desenvolvidos – reduzirem suas emissões, melhor para o planeta. "São recursos que vão ajudar o Brasil a ajudar o mundo", diz.

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Marcovitch destaca que os países emergentes são os mais capacitados para desenvolver tecnologias limpas e transferir esse conhecimento para as nações mais pobres. "A cooperação internacional não pode ser vista só como um fluxo de recursos, em que um dá e o outro recebe. É um caminho para chegar a um objetivo comum, em que todos se beneficiam."