Há quatro anos na chefia da embaixada brasileira em Pyongyang, Roberto Colin, 62, soube do teste nuclear da Coreia do Norte pela TV, em anúncio oficial do ditador Kim Jong-un. Passava das 10h desta quarta-feira (6), início da madrugada no Brasil.
“Como não entendo bem coreano, pedi ajuda aos tradutores e eles me falaram do que se tratava”, disse ele à Folha de S.Paulo. Os dois únicos funcionários do posto, aliás, “estavam muito orgulhosos” diante da novidade, a exemplo de pessoas que se reuniram em volta de telões da capital do país para receber e comemorar a notícia.
“Ouvi daqui da embaixada os alto-falantes transmitindo notícias e palavras de ordem, exultantes”, diz o diplomata, único brasileiro no país asiático.
Em seguida, a agência de notícias oficial divulgou nota sobre o assunto, relatando o feito e destacando que o acontecimento ficará registrado em “local especial” na história do país. Mais tarde, a reação positiva da população também foi transmitida na televisão.
Em poucas horas, a Coreia do Norte se tornaria o centro das atenções no cenário internacional: o país anunciou ter realizado “com sucesso” seu primeiro teste de uma bomba de hidrogênio, cujo potencial destrutivo é muito superior ao de uma bomba atômica tradicional.
A notícia foi relatada pelo embaixador em despachos ao Itamaraty e a embaixadas próximas, como Pequim e Seul. Foi possível ainda enviar as primeiras reações ao teste, por diversos países e entidades.
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Leia a matéria completaAo longo do dia, Colin conversou com representantes do pequeno corpo diplomático instalado no país – ao todo, são 24 embaixadas. Segundo ele, a comunidade local foi surpreendida pela notícia. O programa nuclear sequer foi mencionado no discurso de Ano-Novo do líder norte-coreano.
Motivos
Para o embaixador, vários motivos podem justificar a realização do teste neste momento: o aniversário do líder norte-coreano, na próxima sexta (8); um recente estremecimento das relações da Coreia do Norte com a China e a Coreia do Sul; o congresso do partido, em maio, após um hiato de 36 anos; e a tentativa de pressionar os Estados Unidos a fazer um acordo de paz com o país.
“Tudo é sempre coreografado neste país, nada é por acaso. Às vezes falam que [os comandantes da Coreia do Norte] são imprevisíveis, irracionais. Não é nada disso, são extremamente profissionais. O que não quer dizer que não cometam avaliações erradas”, ponderou o diplomata.
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Leia a matéria completaNesta quinta-feira (7), ele terá um encontro com um representante do Ministério das Relações Exteriores da Coreia do Norte, agendado previamente – o teste da bomba de hidrogênio certamente estará em pauta. O tema também deve ganhar destaque no jantar promovido pelo titular da pasta, Ri Su-Yong, ao corpo diplomático instalado no país, na próxima semana.
Sanções
O anúncio motivou um pedido, de Japão e Estados Unidos, de uma reunião extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas, ainda nesta quarta. Para o embaixador brasileiro, o país asiático pode sofrer “sérias consequências diplomáticas”, mas, a longo prazo, a medida pode ser vista internamente como positiva.
“O cálculo me parece ser o seguinte: se há prejuízos e grandes no curto prazo, no longo prazo, [o teste] é fundamental para a dissuasão, para evitar qualquer intervenção norte-americana”, avalia. Ele também não acredita em uma reação mais incisiva da vizinha China, um dos principais aliados da Coreia do Norte.
China e Coreia têm uma extensa fronteira terrestre em comum, e um eventual distúrbio no país vizinho pode repercutir na China, avalia Colin. “Um colapso do regime [norte-coreano] seria muito perigoso para a China, com êxodo de milhares de pessoas”. Em nota, a chancelaria chinesa afirmou se opor “firmemente” a testes nucleares na região e reforçou que “a península coreana deve ser desnuclearizada”.
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