O caso de Honduras já seria interessante pelo ineditismo de canalizar o amplo repúdio da comunidade internacional a golpes militares e a interrupções bruscas e ditatoriais da normalidade democrática
A atual crise vivida por Honduras constitui um caso importante a ser estudado pelo direito internacional do nosso país. Primeiro, porque se trata de um conflito que repercute mundialmente e que implica de modo amplo a América Latina e, em particular, o Brasil. Também porque a análise requer a ponderação de diversos aspectos, os quais incluem a legalidade do governo hondurenho e a aplicação de medidas e normas por uma autoridade que não é reconhecida internacionalmente como legítima e, ao mesmo tempo, um amplo espectro geopolítico que vem determinando as ações adotadas por outros países.
O Brasil atualmente está no centro da crise por haver recebido José Manuel Zelaya Rosales em sua embaixada na condição de convidado. Zelaya não foi recebido na condição de asilado político, mas de presidente legítimo. Essa condição de autoridade constitucional já havia sido confirmada por outros 192 países nas Nações Unidas que, por unanimidade, votaram uma resolução de repúdio ao golpe de Estado, exigindo a restauração imediata e incondicional do presidente eleito.
No âmbito interamericano, a decisão unânime foi no sentido da suspensão de Honduras da Organização dos Estados Americanos (OEA) com base na ruptura da ordem democrática e no fracasso de iniciativas diplomáticas (Carta Democrática Interamericana).
Outros Estados também adotaram medidas concretas como forma de pressionar o governo golpista a restabelecer a legitimidade. A Comissão Européia anunciou o congelamento de um fundo de ajuda orçamentária ao governo de Honduras e ratificou a suspensão das negociações de um acordo comercial com os países da América Central até que o presidente deposto retorne ao poder. França, Espanha e Itália tomaram medidas de repúdio ao golpe e o embaixador da Alemanha deixou o país.
A Espanha comunicou a expulsão do embaixador hondurenho em Madri, destacando ser um ato de coerência com o compromisso da comunidade internacional de manter a interlocução oficial com o governo constitucional de Honduras.
O Departamento de Estado norte-americano, embora pressionado por setores ultraconservadores, anunciou a suspensão da concessão de vistos não emergenciais a cidadãos hondurenhos e planejam cortar mais de US$ 25 milhões em assistência caso Zelaya não seja restituído à presidência.
O caso de Honduras já seria interessante pelo ineditismo de canalizar o amplo repúdio da comunidade internacional a golpes militares e a interrupções bruscas e ditatoriais da normalidade democrática.
Mas outros elementos o fazem especialmente chamativo, como o posicionamento do Departamento de Estado norte-americano até o momento e a expectativa pelos gestos futuros, a mudança de postura da OEA, que também responde a uma renovação trazida pelo governo de Obama, e a coordenação latino-americana em torno de causas comuns.
O Brasil vive um momento de respeitabilidade internacional sem precedentes e que tem contribuído para sedimentar novos consensos junto a organismos internacionais, mas diante da imprevisibilidade com que atuam os golpistas, a gestão da crise dependerá fundamentalmente da perícia diplomática brasileira e do cuidado técnico em não contribuir para o aprofundamento da violência militar.
Carol Proner é doutora em Direito, professora de Direito Internacional da UniBrasil e pesquisadora da lÉcole des Hautes Études en Sciences Sociales em Paris e professora do Programa de Direitos Humanos e Desenvolvimento da Universidade Pablo de Olavide, Sevilha
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