Curitiba - O arquiteto brasiliense Dionísio França, de 32 anos, trabalha em Tóquio e vive em uma cidade próxima. Ele sentiu o tremor de sexta-feira e levou cinco horas para conseguir se reencontrar com a esposa. Ficou impressionado com a organização dos japoneses, que estão fazendo filas ordenadas nas lojas para comprar comida e água. Nesta entrevista concedida, por e-mail, para a Gazeta do Povo, ele conta sua experiência, que dá uma ideia de como a sociedade japonesa lida com os terremotos:
Onde você estava no momento do tremor e como foi?
Senti dois tremores extremamente fortes. Os tremores menores não pararam até agora. Estava no trabalho. A empresa ocupa o terceiro, quarto e quinto andares de um prédio construído há mais ou menos 30 anos. Ultimamente estavam ocorrendo pequenos terremotos com frequência. Como o terremoto começou a ficar forte, fui até a saída de emergência e abri a porta. Abrir a porta da saída de emergência é uma medida de precaução, pois as portas podem ficar emperradas se o terremoto for forte e impedir a evacuação. O terremoto continuou forte e algumas pessoas decidiram evacuar o prédio. Eu também saí e desci até a rua. Ouvi o barulho de alguns pedaços de azulejo caindo. Na rua tinha bastante gente, gente da minha empresa e de outras. O tremor continuou por ainda algum tempo, os postes e os prédios balançavam. O tremor parou e voltamos ao trabalho.
Foi possível voltar a trabalhar?
Tomei um susto ao voltar, pois o escritório estava todo bagunçado. Não dava para andar em alguns lugares, pois pilhas de documentos estavam espalhadas pelo chão. Coloquei meus livros e minhas coisas de volta nas prateleiras e pouco tempo depois outro forte tremor veio. Desta vez foi mais fraco que o primeiro, mas mesmo assim eu evacuei o prédio e voltei depois que o terremoto passou.
Qual foi a reação da sua empresa?
Depois do terremoto, o chefe de Recursos Humanos nos comunicou que podíamos voltar para casa, mas que era mais seguro continuar no prédio. A empresa ofereceu alimentação e transporte, que não estavam previstos. Além disso, contataram ou tentaram contatar todos os funcionários que não estavam no escritório.
Quanto tempo você precisou esperar até poder ir para casa?
O primeiro terremoto foi depois das três da tarde, então fiquei em dúvida se devia ir para casa ou ficar, pois fiquei sabendo que os trens estavam parados e que a energia tinha sido cortada na região onde moro. Resolvi voltar para casa às sete da noite, que seria meu horário normal. Conversei com a minha esposa por um aplicativo do i-phone que usa a conexão via internet para ligações telefônicas [as linhas haviam caído]. Meu trabalho fica a uns 30 quilômetros da minha casa, em Hikarigaoka. Combinamos de nos encontrar em Ikebukuro, o terminal de onde sai o trem para nossa casa. Eu fui andando e ela pegou um táxi junto com amigos do trabalho. No meio do caminho, ela ligou e disse que o táxi não conseguiria chegar lá e que eles tentariam ir a outra área. Eles demoraram três horas para fazer um percurso que demoraria no máximo 30 minutos. Andando, eu tinha chegado muito mais perto de casa. Resumindo, eu andei 15 quilômetros em cinco horas. Minha esposa conseguiu pegar o metrô de Tochomae até Hikarigaoka, a 15 quilômetros de nossa casa, e conseguimos por sorte pegar um táxi de lá até Saitama, onde moramos. Chegamos em casa à 1 da manhã e o bairro estava sem energia. Felizmente ela voltou de madrugada.
De que outras formas sua vida foi afetada?
Faltou eletricidade e água na primeira noite. Agora faltam pão e água nos supermercados.
Os negócios da sua empresa devem ser afetados?
Eu elaboro relatórios de condições de propriedades para empresas que investem em imóveis. Raramente vamos até a região de Tohoku, a área mais afetada pelo terremoto e pelos tsunamis.
O que seus conhecidos japoneses falam sobre o desastre?
No primeiro instante, todos se preocupam apenas em conseguir notícias sobre os parentes e amigos. Num segundo instante, as pessoas se preocupam em se preparar para possíveis terremotos que podem vir. Li alguns comentários de japoneses elogiando a organização e ajuda entre estranhos no momento do terremoto. Eu concordo com eles, as pessoas fizeram fila nas lojas de conveniência para comprar água e comida, e fila para receber comida em alguns lugares. Nada de tumulto.
Qual sua avaliação sobre o impacto desse desastre sobre a economia e sobre o estado emocional dos japoneses?
Vi um comentário exatamente sobre isso no noticiário hoje (domingo). O Japão é um país exportador. Com as áreas costeiras do nordeste destruídas, a exportação que partiria desses lugares vai ser prejudicada. Além disso, duas usinas nucleares localizadas próximas do centro do terremoto estão danificadas. Tóquio terá apagões seletivos a partir de amanhã. O único ponto positivo é que o governo e a oposição vão parar de brigar pelo poder até colocarem as coisas mais ou menos em ordem. Emocionalmente, ficamos chocados toda vez que ligamos a televisão. A contagem de mortos e desaparecidos cresce e vemos imagens desoladoras.
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