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"Caso Lula tivesse sido presidente na República Velha, o Acre hoje seria território da Bolívia e Santa Catarina, da Argentina." É o que costuma dizer Marco Antonio Villa, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Ele faz parte do grupo de acadêmicos e especialistas que creditam à política externa do atual governo a atitude agressiva que países vizinhos têm tomado contra o Brasil. "Eles se aproveitam de uma diplomacia equivocada", diz Villa.

Do outro lado, está a turma que vê as ações dos vizinhos como reação natural ao crescimento econômico brasileiro. É a mesma síndrome do antiimperialismo americano, mas aplicada ao Brasil. Acham que à medida que o país crescer, mais sofrerá com a animosidade dos vizinhos. Faz parte do jogo geopolítico. "É uma atitude comum por parte de países menores. Para tentar elevar o seu poder de barganha, eles fazem pressão. Hoje, o Brasil ocupa na América do Sul a posição que os EUA ocupam no mundo", diz Cristina Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

O ponto de partida das contestações dos vizinhos teve início em maio de 2006, quando a Bolívia nacionalizou o setor de gás e cancelou contratos com a Petrobras. À época, a atitude do governo Lula foi criticada por ser condescendente demais. O ex-embaixador do Brasil em Washington Rubens Barbosa disse que o Itamaraty estava mais preocupado em "mostrar solidariedade ideológica do que em defender os interesses nacionais".

Depois, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, abalou as relações com o Brasil ao chamar de "papagaios" de Washington os congressistas brasileiros que criticaram sua decisão de não renovar a licença da rede de televisão privada RCTV. Mais tarde, o Paraguai, com o projeto de rever o Tratado de Itaipu, e o Equador, ao expulsar a construtora brasileira Odebrecht e ameaçar não pagar um empréstimo de US$ 243 milhões concedido pelo BNDES, também entraram para o time que coloca o Brasil no alvo.

"A Bolívia abriu um pouco a porta e o Equador arrombou", diz Antonio Villa. A tese dele é de que Lula não consegue conviver com relações conflituosas. "Nas relações entre países, é impossível eliminar contradições. Mas como Lula parece não conseguir conviver em relação de conflito, ele acaba cedendo."

História

O maior desafio da diplomacia brasileira sempre foi a Argentina. As relações entre os dois países se deterioram a tal ponto que, no fim da década de 1970, durante a construção da hidrelétrica de Itaipu, o governo militar argentino chegou a argumentar que a represa binacional era uma tentativa de Brasília de inundar Buenos Aires. "À medida que os países passaram a se redemocratizar, a partir dos anos 1980, uma certa calma pairou nas relações entre o Brasil e os vizinhos. Foi, inclusive, quando surgiu o Mercosul", diz José Alexandre Hage, doutor em Ciências Políticas pela Unicamp e autor do livro Bolívia, Brasil e a Guerra do Gás (Juruá Editora – R$ 49,90).

Foi só com a ascensão do bloco da esquerda populista, liderado pelo venezuelano Hugo Chávez, que o Brasil voltou a ser o saco de pancadas da região. Em parte, com a presença de multinacionais brasileiras nesses países que adotam um discurso nacionalista – Venezuela, Equador, Bolívia, Paraguai –, a reação contra o Brasil é de certa forma previsível. Mas também, como teria dito o Barão do Rio Branco, patrono da diplomacia do país, "nós falamos, eles hablan". Nesse caso, precisamos falar mais, e mais alto.

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