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Não tinha ideia do ataque ao trem até chegar na estação, diz brasileira

A estudante pernambucana Julia Ferreira Grünberg Lindoso, 19, só descobriu que houve um ataque ao trem em que estava quando chegou à estação de Arras, na França.

Passageira do vagão 17, ela ficou a cinco carros do local onde o marroquino Ayoub el Khazzani teria tentado atacar o trem. O suspeito, que carregava um rifle Kalashnikov, uma pistola automática e uma faca, foi rendido por passageiros, incluindo três jovens americanos. O trem, que fazia o trajeto entre Amsterdã, na Holanda, e Paris, foi desviado para Arras, onde a polícia deteve o suspeito.

Julia embarcou no trem da companhia Thalys em Roterdã, na Holanda, onde estuda artes e cultura na Universidade Erasmus. Ela seguia para Paris para encontrar o irmão Vinicius, 25, que mora na capital parisiense, onde trabalha para a OCDE (Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento).

A jovem contou à reportagem que estava ouvindo música com fones de ouvido, quando reparou um sinal sonoro insistente: era o alarme disparado por funcionários da companhia após a tentativa de ataque.

“Parecia o sinal que toca quando chegamos na estação. Até tirei o fone de ouvido para conferir, mas como todos ao meu redor continuaram sentados, agindo da mesma forma, não achei estranho. Como estavam todos tranquilos, eu relaxei”, diz Julia, que estava em sua primeira viagem de trem sozinha.

“Não escutei nenhum barulho de tiro ou algo do gênero. Não tinha ideia do que aconteceu até sair do trem”, completa a jovem, que não chegou a sair de seu vagão.

A estudante conta que nenhum funcionário da companhia foi até o vagão explicar o que tinha ocorrido e nenhum outro aviso, além do apito, foi dado. Ela só percebeu que algo estava errado quando, ao chegar em Arras, um funcionário entrou no vagão e pediu que todos descessem, já que a polícia estava checando o trem.

“Mesmo nessa hora, achei que poderia ser um problema técnico ou algo menor. Tentei pedir informação, mas ninguém falava inglês direito e eu não falo francês”, conta a estudante, que seguiu os outros passageiros pela plataforma da estação.

Ao passar diante do vagão 12, onde o incidente ocorreu, ela viu uma pessoa na maca, outra na cadeira de rodas, além de sangue no chão. Quando tentou parar para observar melhor, ouviu a ordem para que seguisse adiante.

“Eu não pensei que era um ataque terrorista, isso não passou pela minha cabeça em momento algum. Não tinha tantos policiais assim, então achei que era algo menor”, conta.

Espera em Arras

Julia foi então até a entrada da estação, onde viu um “tumulto, cheio de ambulâncias, viaturas e até policiais com cachorro”.

A jovem foi até o guichê de informações, onde conseguiu, com algum esforço, descobrir que haveria um trem para Paris dentro de uma hora, às 20h17. Ela foi, então, esperar o trem aparecer no painel de viagens da estação.

Pouco depois, a estação ficou lotada com a chegada de um segundo trem da linha desviado até Arras. Foi quando todos foram levados pelos funcionários da companhia a um ginásio. “Mesmo nesse momento, ninguém explicou o que estava acontecendo. Eles não falavam inglês e só entendi que pediram para que esperássemos ali”, lembra.

Enquanto esperava, Julia conseguiu trocar mensagens de celular com uma amiga nos EUA. Quando ela explicou que estava na estação de Arras, a amiga enviou uma notícia de um site sobre o ataque.

Pouco depois, a jovem repassou a notícia ao irmão, com quem também trocava mensagens e que aguardava sua chegada em Paris. “Meu irmão me perguntou: “Você percebeu que acabou de se livrar se um ataque terrorista?”, disse Julia.

Foi somente após algumas horas aguardando no ginásio, afirma a brasileira, que um funcionário informou aos passageiros o que estava acontecendo e avisou que todos teriam seus documentos conferidos antes de poder seguir viagem. As informações foram traduzidas para o inglês por um dos passageiros.

“Eu não me estressei em momento algum. Se fosse algo extremamente sério, haveria mais policiais”, argumenta Julia, que disse ter sido tranquilizada também pela imagem de uma criança brincando com o soro de um dos feridos no incidente, que estava na cadeira de rodas.

Aproximadamente às 23h, Vinicius descobriu, na estação de Paris, que enviariam um trem para buscar os passageiros em Arras e alertou sua irmã por mensagem de texto. “Meu irmão me avisou antes mesmo da companhia”, reclama Julia, criticando a falta de organização dos funcionários para lidar com a situação. “O que me deixou angustiada foi não saber o que estava acontecendo”, diz.

Antes de embarcar, contudo, a jovem teve de passar por um policial, que checou seu passaporte, pediu um endereço e um telefone e perguntou se ela “estava bem da cabeça”. “Eu disse que sim!”, lembra, aos risos.

Julia só chegou à capital francesa pouco após à 1h de sábado (22), mais de seis horas após o horário previsto.

Espera em Paris

Enquanto Julia tentava descobrir o que havia acontecido, Vinicius aguardava por informações na estação de trem de Paris.

Primeiro, veio o aviso de que o trem atrasaria 15 minutos. Pouco depois, o atraso seria por tempo indeterminado. Sem informações da companhia, ele descobriu sobre o ataque quando a irmã lhe enviou a notícia por mensagem de texto.

“Como estava conversando com ela por SMS, sabia que ela estava bem. Fiquei mais preocupado sobre como ela ia chegar em Paris, se ia conseguir seguir as instruções corretamente e pegar o trem”, conta à Folha.

Vinicius também criticou a falta de organização da companhia. Ele disse ter tido pouco contato com funcionários da Thalys e que a maioria das informações vinha de pais de passageiros do mesmo trem de Julia, um deles jornalista do “Le Monde” e outro um fuzileiro francês.

Somente no sábado (22), Julia foi procurar nos jornais por mais informações sobre o que tinha ocorrido. “Eu tento imaginar o que teria acontecido se os americanos não tivessem intervindo. Será que ele teria ido para os outros vagões? Será que teria chegado até o vagão em que eu estava?”, diz.

Ela deve voltar a Roterdã nesta segunda-feira (24) de trem. Se está preocupada? “Se eu for traumatizar com essas coisas, não faço mais nada”, diz.

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