Matthew Barney ao lado de escultura da série “Water Cast”, exposta no Museu de Arte Contemporânea em Los Angeles.| Foto: Emily Berl/The New York Times

O ateliê do artista Matthew Barney em Long Island City, no bairro de Queens, Nova York, fica entre armazéns monótonos onde a visão mais infernal é geralmente um cão de guarda acorrentado.

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No entanto, em diversas ocasiões ao longo dos últimos anos, o estúdio foi transformado em uma versão de submundo que até Barney, que tem estômago para tais coisas, chegou perto de seu limite. Lá havia, por exemplo, porcos mortos sendo devorados por vermes. E uma carcaça de vaca estripada, em uma poça rasa.

Os “tableaux ” foram criados para “River of Fundament” [rio do fundamento], filme de quase seis horas de duração estruturado em torno de uma leitura criativa do romance de Norman Mailer “Noites Antigas ”, de 1983.

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O livro, ambientado principalmente no Egito no século 13 antes de Cristo, foi massacrado pela crítica, mas às vezes com um respeito contrariado, pelo esforço de Mailer de transportar o Livro dos Mortos para as letras contemporâneas.

“River of Fundament” é o mais ambicioso empreendimento de Barney desde o ciclo “Cremaster”, os filmes saturados de símbolos feitos a partir de meados dos anos 1990 que o definiram como um dos mais importantes artistas de sua geração.

Assim como grande parte das obras de Barney, o novo filme funciona por si só, mas também como um dínamo para gerar, moldar e superpor significados em um corpo de escultura. Esse corpo, cerca de 85 obras e mais de sete anos de trabalho, é exibido pela primeira vez nos EUA no Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles.

A exposição foi inaugurada em 13 de setembro e deverá ser a única escala americana da mostra, que já esteve em Munique (Alemanha) e em Hobart (Tasmânia, Austrália).

“River of Fundament” se concentra na versão profundamente carnal de Mailer da cosmologia egípcia, em que os mortos em busca da reencarnação devem atravessar um rio de fezes —substituto de um intestino, em que o sustento é processado em dejetos, que, por sua vez, têm o poder de fertilizar novo sustento.

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Barney disse que trabalhou para se equiparar ao sexo e à escatologia que Mailer amontoou em quase todas as páginas. O filme —organizado em torno de performances ao vivo filmadas em Los Angeles, Detroit e Nova York— apresenta defecação, urinação, sexo anal, um saco de colostomia regurgitante e uma cena em que um pássaro sai de uma vagina.

Desde seu lançamento no ano passado, a recepção pela crítica não foi especialmente benigna.

“The Hollywood Reporter” disse: “Barney nos deve mais imagens inspiradas em troca de seis horas de vida que provavelmente não conseguiremos recuperar dos governantes do submundo”.

Barney, 48, disse que por anos sentiu que tinha colocado a si próprio em um canto conceitual. Sua última grande obra foi “Drawing Restraint 9”, história de influência japonesa sobre personagens a bordo de um navio baleeiro, feito em colaboração com Björk.

A saída altamente improvável do canto criativo de Barney acabou sendo “Ancient Evenings”. Ele havia colocado Mailer na série “Cremaster”, e Mailer, que morreu em 2007, tornou-se não apenas um mentor, mas também uma espécie de demiurgo no panteão de Barney. Mailer pediu que Barney lesse o livro egípcio.

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Ambientado em uma época em que os egípcios estavam fazendo grandes avanços no trabalho em metal, “Ancient Evenings” levou Barney a começar a pensar sobre os materiais e a história da escultura de maneiras novas para ele —e num projeto em que a escultura conduziria um filme mais do que havia feito anteriormente.

Sobre filmar em Detroit, com suas visões de um mundo dos mortos americano, Barney disse: “As primeiras visitas lá foram as mais importantes para eu descobrir de que trataria o projeto. É um lugar onde você vê cada camada de história exposta, como em uma ferida aberta”.

Parte da escultura da exposição parece uma explosão de metal líquido congelado em pleno estouro, e é praticamente isso mesmo que ela é. Foi feita usando um novo processo em que bronze fundido é despejado em um buraco cheio de gesso e água. Essas esculturas deveriam evocar o rio Nilo ou as lágrimas da deusa Ísis que o inundam anualmente.

Barney disse esperar que os visitantes vejam a escultura antes ou depois de ver o filme. “Acho que ela amplia os limites do que as pessoas conseguem suportar, mas deveria ser como uma viagem que o afeta fisicamente.”

Barney está se arriscando ao fracasso muito mais do que no passado, com a sombra de Mailer como seu guia desafiador. “Um dos grandes motivos que me atraíram para Norman foi o que eu considerava sua disposição a falhar, a correr o risco de uma espécie de fracasso que seria útil para o resto de nós.”

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