A Alemanha esqueceu como o tratamento punitivo que recebeu após a Primeira Guerra Mundial afetou sua economia e como ela foi ajudada financeiramente após a Segunda Guerra Mundial. Um protesto em Berlim contra o Tratado de Versalhes| Foto: AP/The New York Times

Cresci na Grécia, filho de uma baronesa nascida na Polônia, mas de origem alemã/prussiana oriental, a última de uma longa linhagem de Cavaleiros Teutônicos, e de um comunista grego, coronel da resistência grega que combateu a ocupação alemã.

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Minha mãe se mudou para a Grécia em 1939 e, embora sob muitos aspectos tenha se tornado mais grega que os próprios gregos, conservou sua abordagem teutônica racional à vida, a adesão às normas e um senso forte de “noblesse oblige”.

Bibliotecas resistem em um mundo cada vez mais digital

A página impressa anda em farrapos nos últimos tempos. Livros, revistas, jornais —todos tiveram de encarar questões existenciais na era digital. Ainda assim, as bibliotecas sobrevivem, às vezes nos lugares mais improváveis.

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Quando eu reclamava da irracionalidade da sociedade grega, dizendo que estava farto disso e que queria viver na Alemanha ou em algum outro país “normal”, ela me lembrava: “A grama do vizinho é sempre mais verde”. Ou então: “Eles (os alemães) podem ser tão irracionais e emocionais quanto os gregos, ou até mais”.

Hoje suas palavras se mostram mais verdadeiras do que nunca.

Um ano atrás fui convidado, provavelmente por engano, para participar de um debate em Bruxelas com quatro alemães, todos assessores da chanceler Angela Merkel. Eles eram muito amistosos, descontraídos, até divertidos. Conversamos sobre viagens, família, a crise financeira europeia e, é claro, a Grécia.

Meu crachá trazia meu sobrenome paterno, grego, e o materno, alemão, e parece que eles tinham me tomado por alemão, como eles. Quando admiti que eu era grego, foi como se uma luz tivesse se apagado. A expressão nos rostos dos meus colegas até então simpáticos congelou. Eles pararam de falar comigo e o clima passou a ser de mal-estar.

Eram pessoas inteligentes e instruídas, com muitas letras antes e depois de seus nomes. Não eram como os desconhecidos totais que me vaiaram e assediaram duas vezes no centro de Atenas simplesmente por eu estar de terno e gravata, um traje que a maioria dos gregos associa aos políticos que eles tanto desprezam, os oligarcas e os representantes da chamada “troika” —o Fundo Monetário Internacional, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu.

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Por décadas, a sociedade grega conseguiu somar interesses pessoais, excesso de otimismo e desconhecimento, além do uso seletivo de uma narrativa de esquerda, para encerrar-se em uma bolha. Quando, em junho, o ministro de Estado Alekos Flambouraris previu que os parceiros da Grécia iriam “implorar para nos emprestar dinheiro”, exprimiu o que muitos gregos pensavam.

A elite política grega e seus seguidores acreditam que você só não recebe o que quer se não for assertivo o suficiente e se não tiver “lutado” o suficiente, promovendo protestos, greves e assim por diante. Essa abordagem funcionou na Grécia por décadas: o Estado direcionava dinheiro e privilégios aos que exerciam a maior pressão.

Quando a crise grega explodiu em público e a troika interveio, uma parte da sociedade grega —pessoas frustradas com sua incapacidade de se beneficiar do sistema clientelista do Estado ou que simplesmente tinham a esperança de viver em um país “normal”— tentou enxergar um lado positivo. Essas pessoas acharam que a “prova de realidade” que estava por vir, somada à mentalidade racional de elementos de fora, faria a bolha grega estourar.

Se tivessem ouvido minha mãe, não teriam sido tão otimistas.

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Não que a troika não fosse racional. A decisão de socorrer as instituições bancárias deixadas a descoberto pela Grécia, ao mesmo tempo apresentando o programa como sendo de assistência aos gregos, foi racional, embora sua moralidade fosse duvidosa. O que não se esperava era que a reação europeia à crise fosse sequestrada por um único país, mesmo que esse país, a Alemanha, seja o motor financeiro da Europa. Esse fato introduziria outro nível de irracionalidade à situação.

Como a sociedade grega, a sociedade alemã se vê sob ótica diferente daquela em que outros a enxergam. A narrativa alemã é que o milagre econômico alemão do pós-guerra é fruto de frugalidade, criatividade e trabalho árduo, ignorando a verdade de que seu êxito foi possibilitado pelo apoio financeiro ímpar que o país recebeu dos vencedores da Segunda Guerra Mundial, incluindo a Grécia.

A Alemanha opta por ignorar as lições históricas do tratamento que recebeu após a Primeira Guerra Mundial, quando as reparações desastrosas e os termos punitivos da rendição criaram as condições para o surgimento da República de Weimar e, mais tarde, da ascensão de Hitler.

A devoção quase teológica às “regras” é parte integral da psique alemã. No caso da Grécia, as regras relativas à zona do euro foram desobedecidas, fato que desencadeou a ira da Alemanha. Porém, a Alemanha já mostrou que é capaz de obedecer às regras de maneira seletiva, ao sugeriu uma saída “temporária” da Grécia. Com isso, convenientemente esqueceu sua própria insistência anterior de que, conforme o previsto nos tratados, nenhum país-membro pode sair da zona do euro.

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Arrepios percorreram outras capitais europeias, e até mesmo o ex-ministro das Relações Exteriores alemão Joschka Fischer sugeriu que a posição adotada por seu país “anuncia seu desejo de fazer a zona do euro passar de um projeto europeu a um tipo de esfera de influência”.

Hoje em dia, procuro me refugiar em minha própria “ignorância estratégica” para continuar a acreditar que Bruxelas, não obstante todas as falhas de sua burocracia “da bolha do euro”, vai continuar a ser o ponto focal da unidade europeia. E que não volte a ser nada mais que a capital de um país que, até o final da Segunda Guerra Mundial, era descrito como “o campo de batalha da Europa”.