Como parte das novas medidas do governo, o Ministério da Educação da China pediu a proibição de livros didáticos que promovam “valores ocidentais” como o estado de direito, a democracia liberal e a sociedade civil, além de proibir críticas à liderança do Partido Comunista em sala de aula.
“Os professores jovens e os alunos são os principais alvos da infiltração das forças inimigas”, escreveu o ministro, Yuan Guiren, em dois de fevereiro, no diário do partido, o “Seeking Truth”, e explicou que “alguns países, temendo a ascensão da China, reforçaram a infiltração de formas mais discretas e diversas”.
Entretanto, as novas tentativas da adminsitração de aumentar o controle sobre o discurso intelectual da nação gerou preocupações e raras críticas explícitas entre professores e alunos que rejeitam a ideia de que a pedagogia e os livros estrangeiros representam uma ameaça à sobrevivência do governo — e observam que os argumentos mais fortes contra esse tipo de controle partiram do próprio ministro.
Há quatro anos ele disse, perante um painel consultivo, que restringir o uso do material didático ocidental era errado. “Nenhum volume de recursos estrangeiros colocará em risco a nossa unidade, pois estamos em solo chinês”, afirmou, segundo o artigo de março de 2011 do jornal estatal Jinghua Times.
Referindo-se aos milhares de jovens chineses que saem do país para estudar, ele acrescentou: “Se nós até mandamos tanta gente para fora e eles não foram afetados no ninho do capitalismo, por que haveríamos de temer que acontecesse aqui?”.
A mudança drástica de sua postura enfatiza a tensão, cada vez maior, entre acadêmicos e membros do partido em relação à educação chinesa.
“Estou decepcionada com o ministro. Ele parece não ter firmeza nenhuma, está só dizendo o que seus superiores querem que diga”, observa Helen Wu, aluna de 25 anos da Universidade Shantou, na província de Guangdong.
Yuan defende novas diretrizes que fariam com que as maiores instituições de ensino do país dessem prioridade aos ensinamentos marxistas, à lealdade ideológica ao partido e às opiniões do presidente Xi Jinping.
Ele, aliás, recentemente descreveu as escolas chinesas como “a linha de frente ideológica” em uma batalha contra conceitos como estado de direito, sociedade civil e direitos humanos. Qualquer “manifestação errada” nos fóruns de Ciências Sociais e Filosofia deve ser silenciada.
Para alguns, os comentários de Yuan lembram as campanhas de purificação ideológica da Revolução Cultural de 1966-76, década de caos e violência desencadeados por Mao. Em três anos o número de estudantes chineses em faculdades norte-americanas subiu 75 por cento, para superar 274 mil no último ano acadêmico, fazendo deles o maior contingente de alunos estrangeiros nos EUA, de acordo com o Instituto de Educação Internacional — e entre eles, inclusive, a filha do presidente, que estudou em Harvard.
Até pouco tempo, Yuan parecia ser defensor ardente de tais intercâmbios. “Podemos aprender com quem vem de fora, sejam ricos ou pobres, socialistas ou capitalistas; contanto que sejam benéficos ao nosso desenvolvimento, podemos aprender com todos”, afirmou em 2011.
Shen Kui, professor da Faculdade de Direito da Universidade Peking, uma das instituições mais respeitadas do país, publicou uma carta aberta desafiando o ministro a “definir claramente a diferença entre ‘valores ocidentais’ e ‘chineses’”.
Além disso, alertou-o a não violar a lei ou a constituição chinesa, incluindo a garantia de “liberdade de se engajar em pesquisas científicas, criações literárias e/ou artísticas e outros exercícios culturais”.
Ideólogos do partido contra-atacaram na imprensa estatal, exigindo punição rigorosa para possíveis inimigos liberais, incluindo empreendedores de destaque, advogados, artistas e professores. Em editorial, Zhu Jidong, da Construção Nacional de Ideologia e Segurança Nacional, alegou que as autoridades devem “eliminar os professores que publicam críticas ao partido e ao socialismo antes que possamos defender a virtude e condenar o mal”.
Em um comentário on-line, em dois de fevereiro, a Universidade jurou lealdade às novas diretivas do governo e pediu aos alunos que “não se deixassem levar pelos valores errôneos do Ocidente”.
De acordo com o texto, “as universidades chinesas possuem uma característica socialista e é por isso que devemos nos ater a esse modelo de educação”.
Xia Yeliang, em visita ao Instituto Cato em Washington, disse que a campanha para difamar os valores ocidentais é hipócrita.
“Karl Marx por acaso era oriental? O marxismo e o socialismo não foram adotados do Ocidente?”, questiona.