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Epidemia

Nove meses depois de ser declarado emergência global, zika ainda intriga cientistas

 | MARVIN RECINOS/AFP
(Foto: MARVIN RECINOS/AFP)

Quase nove meses após o zika ter sido declarado uma emergência de saúde global, o vírus já infectou pelo menos 650 mil pessoas na América Latina e nas ilhas do Caribe, incluindo dezenas de milhares de grávidas. Porém, muito para a surpresa dos cientistas, a epidemia acabou não produzindo a tão temida onda de deformações fetais que vêm dominando a mídia desde que as primeiras imagens de crianças com má-formação surgiram no Brasil.

Em vez disso, o zika deixou um padrão enigmático e distintamente desigual nos malefícios causados em todas as Américas. Segundo os últimos dados da ONU, dos 2.175 bebês nascidos no ano passado com microcefalia ou outros danos neurológicos congênitos relacionados ao zika, mais de 75% deles estavam acumulados numa única região do mundo: o Nordeste brasileiro.

O padrão é tão complexo que os cientistas e oficiais de saúde voltaram suas atenções à região, tentando compreender o porquê de o impacto do zika ter sido tão maior lá. Eles suspeitam que a culpa seja de outras causas subjacentes, como a presença de outro vírus transmitido por mosquitos, como o chikungunya ou dengue – ou então a possibilidade de haver outros fatores ambientais, genéticos ou imunológicos que se combinaram com o zika para expor as mães a um risco mais severo.

“Não acreditamos que o zika seja a única causa”, disse, em entrevista, Fátima Marinho, diretora do Departamento de Doenças Crônicas e Promoção da Saúde, do Ministério da Saúde do Brasil. As autoridades brasileiras estavam se preparando para uma enxurrada de deformações fetais, conforme o zika foi se disseminando, neste ano, para outras regiões do país, segundo Marinho. Porém, “não foi observado um grande aumento nos números”.

Pesquisadores e profissionais de saúde mantêm a cautela quanto a estes números mais baixos do que o esperado. Os últimos estudos revelam mais provas do que nunca de que o vírus é capaz de infligir danos severos ao cérebro infantil em desenvolvimento, parte dos quais pode até mesmo não se tornar evidente até mais tarde na infância.

Mas os pesquisadores até agora aprenderam muito mais sobre os malefícios em potencial do Zika do que sobre as probabilidades de eles ocorrerem.

Apesar de a epidemia ter se espalhado este ano para mais de 50 nações e territórios em todo o hemisfério ocidental, dados da ONU mostram apenas 142 casos de defeitos congênitos ligados ao zika fora do Brasil até o momento.

Por exemplo, na Colômbia, – um país elogiado pelos padrões rigorosos de detecção e monitoramento do zika – o governo já contou mais de 104 mil casos de zika, incluindo quase 20 mil mulheres grávidas. É o segundo maior número de infecções de zika no mundo, depois do Brasil. Mas, até o momento, apenas 46 bebês nasceram no país com problemas congênitos do sistema nervoso relacionados ao zika. Outros 332 casos estão sob investigação. Números bem abaixo do o país havia se preparado para enfrentar.

“O nosso enfoque dado ao zika mudou”, disse Ernesto Marques, epidemiologista da University of Pittsburgh que trabalha num projeto para desenvolver uma vacina para o vírus. Marques é do Recife, a cidade brasileira mais afetada pela epidemia de zika, e integrou a equipe que identificou o vírus pela primeira vez como possível culpado pelas deformações fetais que começaram a surgir “quase todos os dias” nas maternidades da capital por volta desta época no ano passado.

À época, Marques disse que os cientistas se concentram em identificar o zika como “agente causal” do aumento súbito em defeitos congênitos, sobretudo microcefalia, em que os bebês nascem com a cabeça com um tamanho abaixo do normal, muitas vezes também com tecido cerebral calcificado.

“Agora chegamos à conclusão de que o zika era a arma, mas não sabemos quem puxou o gatilho”, disse Marques, falando do Recife, onde trabalha com pesquisadores do governo.

Uma das principais teorias, segundo ele, é que a última epidemia de dengue no Nordeste foi em 2003 – há bastante tempo, relativamente –, então é possível que as mães na região tenham relativamente menos anticorpos para lidar com o zika, que é transmitido pelo mesmo mosquito.

“Hábitos sexuais e de higiene podem ter um papel também”, ele disse, explicando que os pesquisadores estão considerando a possibilidade de a transmissão sexual poder infectar o útero e a placenta com o vírus, potencialmente expondo o feto a um risco mais elevado. “Suspeitamos que o vilão tenha um cúmplice, mas não sabemos quem é.”

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