Apesar de celebrado e proclamado como um feito histórico de segurança global, o acordo nuclear entre Irã e as principais potências mundiais ironicamente não foi motivado por um medo ocidental real, segundo análise de Jorge Mortean, geógrafo mestre em Estudos Regionais do Oriente Médio e professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo.
Para ele, o documento assinado nesta terça-feira (14) em Viena, na Áustria, tem um princípio político-econômico e uma importância regional muito mais relevantes. E, neste campo, o professor prefere não arriscar se o saldo é positivo ou negativo.
“O país tem sua tecnologia muito desenvolvida. Mas não que vá, de fato, desenvolver uma bomba atômica”, diz..“O Irã usa seu programa nuclear como uma barganha de sobrevivência. É um curinga para que nada venha a desestabilizar o regime teocrático autoritário extremamente impopular no país”, avalia.
Politicamente, nada muda na nação do Oriente Médio. Mas ela se beneficia economicamente. Se os termos do acordo forem aprovados pelo Congresso americano (o que deve acontecer em até 60 dias), levantam-se as sansões econômicas impostas ao país – o que dá um fôlego extra ao regime de Teerã perante uma iniciativa privada cada vez mais descontente no país.
“Com a ausência de sanções, empresas europeias (e triangulações de outras norte-americanas), bem como empresas de todo o mundo, voltarão a operar no Irã e injetar bilhões na economia persa”.
O Ocidente também se beneficia: terá novamente à disposição um belo mercado consumidor de 75 milhões de habitantes, a maioria de jovens (70% da população iraniana tem menos de 35 anos). “A Europa será gratificada. Antes das sanções, a Grécia importava 50% de sua matriz energética do Irã. Agora vai voltar a contar com esta fonte. O petróleo iraniano será uma opção para que os países dependam menos da Rússia”, exemplifica.
Até mesmo o Brasil se beneficia. “Nossas relações sempre estiveram muito bem com o Irã. Exportamos carne bovina, frango, arroz e milho e importamos açafrão, tapetes, pistache e polietileno. Com o aumento das sanções, tivemos que frear. Com a reabertura, nosso comércio com o país poderá duplicar as relações”, diz.
Por fim, ganha também a diplomacia norte-americana, que prova poder negociar com qualquer regime autoritário -- embora a consolidação ainda dependa da aprovação no Congresso em um momento político importante no país.
Tensão regional
Mas, se politicamente as coisas são incertas e economicamente parece haver benefício mútuo, quem perde? Na opinião do professor, os países da região que são rivais do Irã, sobretudo Arábia Saudita e Israel – que também mantém programa nuclear.
“Israel e os países árabes enxergam o regime autoritário de Teerã como um perigo, já que o Irã é o maior país da região em território, tem uma população considerável, domina ciência e tecnologia e não vai extinguir seu programa nuclear, mas apenas reduzi-lo”. Boa parte deste medo ocidental em relação à segurança vem do discurso pregado pelos rivais, destaca Moerten.
“Fizeram grandes concessões em todos os temas que deviam impedir que o Irã consiga armas nucleares. Adicionalmente, o Irã receberá bilhões de dólares para alimentar sua máquina terrorista e sua agressividade e expansão pelo Oriente Médio”, declarou o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, logo após o anúncio do acordo.
A negociação nuclear parece ter chegado ao fim, mas uma batalha diplomática regional só está começando seu novo capítulo.
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