A vitória da campanha a favor da saída do Reino Unido no referendo sobre sua situação como membro da União Europeia será problemática para os negócios, para os mercados e para a política. Abaixo, segue uma pequena amostra de quem saiu ganhando e quem saiu perdendo com essa votação.
Quem saiu ganhando
Boris Johnson e Michael Gove
Os dois eram os principais rostos da campanha a favor da saída, que se via por toda parte. O ex-prefeito de Londres e o Secretário de Justiça serão os heróis dos congressistas do Partido Conservador, que são profundamente anti-UE e estão bem posicionados agora que o primeiro ministro David Cameron declarou que irá renunciar.
Na corrida para ocupar esse espaço, “os dois terços do partido que são eurocéticos podem muito bem votar a favor de Boris ou Gove”, disse Jon Davis do King’s College, em Londres. Eles formaram uma dupla eficiente durante a campanha pela saída, formando “uma narrativa implacável”, ao combinarem, segundo Davis, a verbosidade de Johnson com o aspecto mais cerebral de Gove. Essa também foi uma vitória para o líder do Partido de Independência do Reino Unido, Nigel Farage, que não era parte da campanha oficial, mas que faz um quarto de século que vem defendendo a separação.
Marine Le Pen e Vladimir Putin
A líder da Frente Nacional da França, que tem uma forte postura anti-imigração, não fez nenhum esforço para esconder seu apoio pela separação britânica e pelas esperanças de que a UE se desintegre. Um ano antes das eleições nacionais francesas, é possível que suas contrapartes na Alemanha, Holanda, Bélgica e Itália saiam fortalecidas também.
O presidente Putin é outra figura que deve ter ficado contente. Uma Europa dividida e distraída será menos capaz de concentrar esforços para opor-se aos planos que a Rússia reserva para a Ucrânia ou para desenvolver uma política energética que reduza a influência de Putin nos mercados de gás natural.
Os advogados
Desfazer quatro décadas de legislações da UE, negociar novas relações com o bloco europeu e embarcar em acordos comerciais com o restante o mundo, tudo isso significa que uma coisa é certa: honorários. Advogados com experiência em acordos internacionais poderão contar com uma imensa demanda em Londres durante os próximos anos. Especialistas terão a oportunidade de cobrar extra por escassez: faz décadas que a Inglaterra não negocia seus próprios acordos comerciais e “não há expertise” para começar do zero agora, diz Wolfgango Piccoli, copresidente da firma de consultoria Teneo Intelligence.
Quem se opõe a regulamentações
Apesar de a maioria das grandes companhias ser ferrenhamente contra o Brexit, algumas eram da opinião de que sairão beneficiadas por conta da regulamentação mais leve e do maior crescimento econômico que isso acarretará. O fundador da JD Wetherspoon, Tim Martin, distribuiu bolachas de bar anti-UE e anti-FMI em alguns de seus 1000 pubs de baixo custo no Reino Unido e na Irlanda. David Ross, fundador do que era o Carphone Warehouse Group, também se uniu a um grupo que apoiava a saída, com base no argumento de que as normas da UE eram prejudiciais aos pequenos negócios.
O ouro e outras garantias
Os investidores agora estão atrás dos ativos mais seguros que puderem encontrar. O ouro teve sua maior alta em dois anos, ao passo que o franco suíço chegou à sua força máxima desde que o Banco Central removeu as restrições no ano passado. As mineradoras de ouro deverão continuar em ascensão. Entre elas: a Randgold Resources, a Fresnillo e a Polymetal International.
Dublin, Amsterdã e outros centros financeiros
A Irlanda, a Holanda e os países nórdicos todos já se ofereceram para ocupar a vaga de Londres. O Brexit colocará dificuldades para que os bancos de Londres possam vender seus serviços na UE, e possíveis restrições à imigração colocarão em xeque sua capacidade de contratar funcionários europeus. Antes do referendo, o governo irlandês abordou os grandes bancos com a intenção de vender-lhes operações de realocação na Irlanda; e a Nasdaq Inc. ofereceu as bolsas nórdicas sob seu controle como uma alternativa a Londres para ofertas públicas iniciais.
Quem saiu perdendo
David Cameron e George Osborne
O próprio David Cameron (foto) foi quem causou isso a si mesmo. O primeiro ministro optou por convocar um referendo como parte dos esforços para reunir apoio dos conservadores anti-UE e desafiar o Partido de Independência do Reino Unido. Agora ele diz que irá renunciar dentro de três meses, e há grandes chances de que o seu legado venha a ser definido por essa votação. É possível que seu braço direito, o chanceler do tesouro, Osborne, antes visto como provável sucessor em potencial, tenha sido prejudicado também.
O establishment político e empresarial
Basicamente qualquer um que tivesse um microfone à mão estava pedindo para que os ingleses votassem contra a saída: o presidente Barack Obama, a diretora do FMI Christine Lagarde, o primeiro ministro canadense Justin Trudeau, só para dar alguns nomes. Líderes empresariais como Jamie Dimon da JPMorgan Chase avisaram que a saída resultaria na perda de empregos para o Reino Unido. “É um momento crítico na história da queda de confiança do público em instituições e no establishment”, diz Ian Bremmer, fundador da companhia de consultoria política Eurasia Group.
Os grandes bancos
Seus problemas com o Brexit serão legião e isso já é observável nas suas ações. Haverá anos de incertezas quanto às regulamentações, bem como uma provável crise em novas cotas e fusões, que afetarão as comissões de consultoria. Picos de valorização de moeda podem prejudicar bancos como o Saxo Bank e o FXCM, que saíram queimados pela crise do franco suíço de 2015. E aí temos os próprios banqueiros: firmas internacionais agora terão de pesar as possibilidades de deslocar equipes e operações para a Europa continental.
Acordos
O plano de US$14 bilhões da Deutsche Boerse para sua fusão com o London Stock Exchange Group poderá estar em risco. A fusão, após a qual a nova companhia terá sua sede em Londres, domiciliada no Reino Unido, exige a aprovação do governo do estado de Hesse, na Alemanha. Os políticos veteranos dos partidos no governo alemão indicaram desconforto com a ideia de uma fusão num Reino Unido externo à UE. As empresas afirmam estarem comprometidas com o acordo, porém o CEO da Deutsche Boerse, Carsten Kengeter, tinha dito que alguns ajustes poderiam ser necessários para se adequar às “novas realidades” se a campanha pela saída vencesse.
As empresas expostas ao Reino Unido
As ações de empresas britânicas cujo principal mercado é o doméstico sairão prejudicadas, e as que mais sofrerão são as empresas médias que constam no índice FTSE 250, já que as firmas maiores do FTSE 100 tendem a ser menos dependentes da renda inglesa, segundo analistas da unidade de gestão financeira do UBS Group. “As firmas médias do índice FTSE 250 representam 50% das vendas no Reino Unido, contra os 25% do FTSE 100”, disse Caroline Simmons da UBS.
O crescimento
A turbulência causada pelo referendo prejudicou os investimentos e os empregos, segundo o Bank of England, e o crescimento econômico caiu 0,4% no primeiro trimestre. O Banco Central, cuja próxima reunião será dia 14 de julho, provavelmente precisará dar maior apoio, segundo economistas. A queda da libra – em sua maior baixa nos últimos 30 anos – pode não ajudar muito se a zona do euro desvalorizar também, já que sete dos principais parceiros comerciais do país estão nela. Pode haver uma recessão, segundo o tesoureiro do Reino Unido e governador do Bank of England, Mark Carney.
Garantias incertas
A coroa norueguesa está entre as moedas mais vulneráveis ao Brexit: o Reino Unido é o segundo maior parceiro comercial da nação. Outro problema é o maior produto de exportação da Noruega: o petróleo, que deverá ter agora sua maior queda desde 20 de janeiro.
Londres e seu mercado imobiliário
Citigroup, Morgan Stanley, JPMorgan e BlackRock estão entre os empregadores internacionais que podem cortar vagas em Londres após a separação, o que prejudicaria a arrecadação de impostos e afetaria os preços dos imóveis. Uma deterioração das condições de crédito prejudicará imobiliárias como a Barratt Developments Plc e Canary Wharf Group Plc, que afirmaram que a saída da UE teria um impacto sobre projetos de desenvolvimento e aumentaria os custos de construções de novos imóveis.
O caso imprevisível
Os separatistas escoceses
O Partido Nacional Escocês, que está no governo da Escócia, pediu aos escoceses que votassem contra a saída. Ainda assim, a líder Nicola Sturgeon (foto) disse que um voto pela saída, presumindo que a Escócia seguisse o caminho oposto, poderia sustentar um novo referendo pela independência escocesa, dois anos após o fracasso do referendo anterior. É uma proposta fiscal complicado de se fazer, agora que os preços do petróleo, a principal exportação escocesa, giram em torno de US$50 o barril. E os governos da Espanha e da Bélgica, com medo de fortalecerem seus próprios movimentos regionais de independência, poderiam barrar um pedido da Escócia para participar da UE.
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