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Artigo

Se não agora, quando?

O atual desenrolar dos acon­­tecimentos no mundo ára­­be é a maior chamada para despertar de todos os tem­­pos.

E a mensagem do outro lado da linha é muito clara: "Estados Unidos da Améri­­ca, vocês construíram suas casas ao pé de um vulcão.

Es­­se vulcão está agora expe­­lin­­do lava em diversas fis­­suras e o barulho que ele emite indica que vai explodir. Ti­­rem as suas casas daí!" No caso, "tirem as suas casas daí" significa "abandonem o vício pelo petróleo"

Ninguém torce mais do que eu pelo sucesso dos movimentos de­­mocráticos do mundo árabe. Mas, mesmo que as coisas terminem bem, a trajetória será longa e cheia de obstáculos. O melhor que podemos fa­­zer neste instante é criar um imposto de US$ 1 por galão de gasolina, que seria introduzido em fases – 5 centavos por mês a partir do início de 2012 – e cuja arrecadação serviria para acabar com o nosso déficit orçamentário norte-americano.

Aprovar hoje uma lei que tornasse a energia mais cara no futuro, como observa o economista Alan Blinder, da Uni­­versidade Princeton, forçaria uma mudança no consumo e nos investimentos antes que o imposto fosse efetivamente sentido. Com apenas um pequeno tributo sobre a gasolina, poderíamos nos tornar mais seguros economicamente e es­­trategicamente, ajudaríamos a vender mais Che­­vrolet Volts e estaríamos livres para apoiar manifestações pela democracia no Oriente Médio, sem nos preocuparmos se isso iria afetar ou não os nossos interesses. Sim, o preço da gasolina subiria. Mas ele já está subindo de qualquer forma, pessoal. Que ao menos fiquemos com um pedaço desse aumento.

Já não era sem tempo. Nos últimos 50 anos, os Estados Uni­­dos (e a Europa e a Ásia) trataram o Oriente Médio como se a região fosse um punhado de postos de gasolina.

O posto Arábia Saudita, o posto Irã, o posto Kuwait, o posto Bahrein, o posto Egito, o posto Líbia, o posto Iraque, o posto Emirados Árabes Unidos etc. Nossa mensagem para esses países era muito consistente: "Ra­­pazes (só falávamos com rapazes), o negócio é o seguinte: mantenham as bombas funcionando e o preço do petróleo baixo, não se incomodem demais com os israelenses e, dessa ma­­neira, vocês podem fazer o que bem entenderem por aí. Podem privar seu povo dos direitos civis que quiserem.

Podem se envolver em corrupção o tanto que quiserem. Nas mesquitas que mais gostam, podem pregar a intolerância da forma que acharem me­­lhor.

Podem divulgar da forma que bem entenderem as teorias da conspiração a nosso respeito. Podem manter as mulheres analfabetas pelo tempo que de­­sejarem.

Podem erguer gi­gantescos sistemas de bem-estar social e sem nenhuma capacidade de inovação, tudo do tamanho que desejarem. Podem deixar de educar sua juventude, se acharem que isso é bom. Apenas mantenham as bombas funcionando e o preço do petróleo baixo e não incomodem muito os judeus. De resto, podem fazer o que bem entenderem."

Foi essa atitude que permitiu que o mundo árabe ficasse de fora da história pelos últimos 50 anos – com os países, durante décadas, liderados por um mesmo grupo de reis e ditadores. Bem, a história resolveu voltar para lá.

A combinação de inflação dos alimentos, grandes bolsões de juventude desocupada e redes sociais que permitem que os jovens se organizem contra os líderes está quebrando as barreiras de medo que ainda mantinham as cleptocracias no poder.

Mas apertem os cintos. Esse não será um passeio alegre, afinal de contas a panela de pressão explodiu em toda uma região com instituições frágeis, escassos movimentos civis e praticamente nenhuma tradição democrática nem cultura de inovação.

O Relatório de Desenvol­­vi­­mento Humano sobre esses países, elaborado pela ONU em 2002, nos alertava sobre tudo isso, mas a Liga Árabe fez com que o documento fosse ignorado no Oriente Médio e o Oci­­dente fez de conta que não viu nada. Ainda assim, o tal estudo – compilado por um grupo de intelectuais árabes liderados por Nader Fergany, um estatístico egípcio – era profético.

Vale a pena relê-lo apenas para ter uma noção de como es­­sa transição para a democracia será difícil.

De acordo com o relatório, o mundo árabe sofre de três gigantescos déficits – um déficit de educação, um déficit de liberdade e um déficit de direitos femininos.

Um resumo da pesquisa trimestral sobre o Oriente Médio, lançado no fim de 2002, detalha algumas evidências: o PIB de todo o mundo árabe somado era menor do que o da Espanha.

Em 1980, os gastos per capita com educação nos países árabes equivaliam a 20% das despesas para o mesmo fim nos países desenvolvidos – e esse nível caiu para 10% em meados da década de 1990.

O índice que mede a publicação de artigos científicos por milhão de habitantes equivalia, no mundo árabe, a 2% do patamar de uma nação rica. Quando o estudo foi feito, todos os países árabes traduziam cerca de 330 livros por ano – um quinto do número da Gré­­cia.

Das sete regiões em que o mundo foi dividido, o Oriente Médio tinha a pior nota referente à liberdade no fim dos anos 1990, de acordo com um ran­­king do instituto Freedom Hou­­se.

No início do século 21, o mun­­do árabe contava com mais de 60 milhões de adultos analfabetos, a maioria mulheres. Dentro de 10 anos, o Iêmen po­­de se tornar o primeiro país do mundo a ficar completamente sem água.

Essa foi a alardeada "estabilidade" criada pelos ditadores da região - a estabilidade de sociedades paradas no tempo.

O sucesso dos movimentos democráticos árabes e a modernização dos países seriam bons não apenas para a região, mas para o mundo inteiro.

Preci­­samos fazer o que estiver ao nosso alcance para ajudá-los. Mas que ninguém se iluda sobre o quão difícil e convulsivo será o retorno dos árabes para a história. Vamos torcer por eles, e não ficar no meio do caminho.

Tradução: João Paulo Pimentel.

* Thomas L.Friedman é colunista do New York Times e autor do livro "O Mundo é Plano".

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