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crise política

Tensão imobiliza capital paraguaia

Para grupo de manifestantes pró-Lugo, que ocuparam a Praça Armada, em frente do Senado, orquestração política em torno do impeachment de Fernando Lugo foi “golpe parlamentar” | Christian Rizzi/Gazeta do Povo
Para grupo de manifestantes pró-Lugo, que ocuparam a Praça Armada, em frente do Senado, orquestração política em torno do impeachment de Fernando Lugo foi “golpe parlamentar” (Foto: Christian Rizzi/Gazeta do Povo)

Cerca de 2 mil policiais cer­­caram o microcentro de As­­sunção ontem. As ruas próximas ao Palácio de López e ao Congresso Nacional estavam fechadas e algumas casas comerciais situadas na área não abriram as portas. Todo o país se voltava para o que acontecia na capital, onde as aulas nas redes públicas e privadas foram suspensas.

Policiais antimotim ficaram o tempo todo em frente do congresso. Dois carros hidrantes estavam posicionados estrategicamente para serem acionados contra os cerca de 1,5 mil manifestantes pró-Lugo que estavam na Praça Armada, em frente do Senado.

O grupo era formado por campesinos, indígenas e integrantes de movimentos sociais, partidos políticos da base aliada do agora ex-presidente Fernando Lugo.

Acampamento

De acordo com o jornal Color ABC, pelo menos 1,5 mil pessoas decidiram acampar na Praça Armada, dormindo ao relento e aguardando a chegada de 70 veículos vindos do interior do país, trazendo mais manifestantes.

Com bandeiras e faixas, a todo momento, os manifestantes pró-Lugo faziam discursos e classificavam a orquestração política do impeachment de golpe parlamentar. O campesino Narciso Florentin, 49 anos, saiu de Vila Rica, a 360 quilômetros de Assunção para apoiar o presidente. "Eu gosto de Lugo porque ele apoia o campesino", afirma.

EntrevistaRegiane Nitsch Bressan, doutoranda em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo.

"Processo que derrubou Fernando Lugo não foi democrático"

Celio Martins e Irinêo Baptista Netto

A analista Regiane Nitsch Bressan, doutoranda em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo, diz concordar com a declaração de Fernando Lugo, dada pouco depois de acatar a decisão do Senado paraguaio e entregar o poder para o vice, Federico Franco. "Hoje, a história e a democracia paraguaias foram feridas profundamente", disse Lugo. Na opinião de Regiane, trata-se de mais um caso em que a democracia foi agredida na América Latina. "Democracia tão duramente conquistada", diz a professora das Faculdades Integradas Rio Branco.

Na entrevista a seguir, feita por e-mail, a pesquisadora fala sobre o processo que derrubou Lugo e as consequências do que foi definido como "golpe branco".

Na sua opinião, o processo que resultou no afastamento do presidente Fernando Lugo foi justo?

O processo que resultou na destituição do então presidente do Paraguai, Fernando Lugo, não foi democrático, tampouco apresentou motivos específicos para tal destituição. A principal motivação apontada foi a falta de apoio governamental, já que, na época, Lugo assumiu a Presidência sem base parlamentar própria, e com uma aliança frágil e dependente do Partido Liberal, que se opôs rapidamente a seu governo.

Países como Nicarágua e Bolívia se referiram ao episódio como "golpe branco". O que esse termo significa e que tipo de consequências ele pode ter?

O golpe branco acontece sem violência física e intervenção armada, contudo igualmente subversivo à ordem democrática, ao permitir a ascensão de uma figura no poder sem as vias democráticas e o escrutínio popular. É um golpe menos agressivo, mas não deixa de se configurar como um golpe de estado, que fere o princípio democrático, ou seja, a vontade do povo.

A decisão do Senado é final ou Lugo ainda pode recorrer da decisão?

Neste momento, parece-nos que Fernando Lugo não conseguirá recorrer da decisão, já que o seu vice-presidente, Federico Franco Gómez, do Partido Liberal, já tomou posse e está nomeando novos ministros.

A presidente Dilma Rousseff sugeriu que o Paraguai pode ser expulso do Mercosul e do Unasul por não respeitar regras democráticas. Isso é realmente possível?

As organizações regionais preveem em seus tratados, cláusulas democráticas e a defesa do regime democrático. Firmado no âmbito do Mercosul junto ao Chile e Bolívia, o Protocolo de Ushuaia é bastante enfático e explícito: a ordem constitucional e a democracia são condições para a manutenção dos membros no bloco. Dentro do Protocolo está prevista a suspensão dos direitos do membro que romper com a ordem democrática, sendo este impedido de participar dos órgãos ou de outros tratados do Mercosul. No caso, não será a presidente Dilma Rousseff a aplicar tal medida. Os representantes dentro dessas organizações irão intervir, sempre tentando primeiro reverter o quadro antidemocrático. Somente em último caso é possível pensar em expulsão do país dessas organizações.

"Hoje, a história e a democracia paraguaias foram feridas profundamente", disse Fernando Lugo. Poderia, por favor, comentar essa declaração?

Concordo com a declaração do presidente deposto. É mais um caso em que a democracia foi violentamente ferida na América Latina. Democracia tão duramente conquistada, e que ainda está se fortalecendo na nossa região. A população paraguaia submetida por mais de 30 anos em um regime autoritário imposto pelo Partido Colorado, não teve tempo para assistir ao desenvolvimento democrático no país e se fazer realmente representada durante seu governo.

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