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Felipe LIma

Tenho defendido a tese de que os liberais deveriam se unir aos conservadores de boa estirpe para reverter o estrago causado pelos “progressistas” no mundo, especialmente no que tange à cultura e aos valores morais. O pêndulo extrapolou, e liberdade individual passou a ser confundida com libertinagem, Estado laico com ódio ao cristianismo, e ceticismo humilde com relativismo moral.

Dentro do que se resolveu chamar de direita, porém, existem vários tipos distintos. Podemos definir diferentes critérios para traçar as linhas divisórias, mas vou usar um só aqui, de forma um tanto arbitrária: aqueles que se preocupam com os valores conservadores no longo prazo, e aqueles que pensam basicamente em “fazer política”.

No livro A beleza salvará o mundo, Gregory Wolfe tenta justamente resgatar o humano por meio das artes em uma era ideológica. Quando falamos em “guerra cultural”, o termo “guerra” já denota a necessidade de eliminar o inimigo. O adversário deixa de ser alguém de quem discordamos, mas com quem podemos conviver de forma civilizada, e passa a ser alguém que merece ser aniquilado.

O artista que coloca sua arte a serviço da ideologia está fazendo proselitismo, não arte

Tal postura combina muito pouco com os conservadores que mais admiro. Esses entendem que a política com “p” minúsculo é necessária, mas é algo menor, que jamais deve se transformar num fim em si mesma. Esses pensadores sabem muito bem que a própria política normalmente segue os valores enraizados na sociedade, e quem quer mudar ou preservar uma civilização deve, acima de tudo, investir nesses valores, na cultura.

Rodrigo Gurgel, professor de literatura, escreve no prefácio que nós, brasileiros, “estamos congelados, há séculos, numa cápsula de incultura”. Não há como negar, e por isso a política nacional tem sido palco de tanta baixaria. Quem quer mudar o Brasil para valer terá de focar nesse aspecto cultural, não em qual partido vai vencer as próximas eleições. Claro que, dependendo do partido, o retrocesso pode ser brutal, como foi com o PT. Mas a verdadeira mudança, aquela sustentável, vem somente com a cultura.

“A oposição política à agenda esquerdista é fundamental. Mas só a cultura pode promover uma verdadeira renovação da sociedade”, escreve Gurgel. Ele acrescenta: “Se preferimos a ação revolucionária antes da ‘compreensão contemplativa da ordem transcendente’, então somos marxistas – e estamos submetidos à ideologia da modernidade”. Afinal, era Marx quem acreditava que cabe ao filósofo mudar a história, “fazer política”.

O artista que coloca sua arte a serviço da ideologia está fazendo proselitismo, não arte. A era moderna viu grande quantidade disso, assim como muita vulgaridade e porcaria. Mas Wolfe acha um erro colossal muitos conservadores rejeitarem por completo tudo que é moderno, encarando arte apenas como um museu. Isso deixa o espaço totalmente livre para os piores. É preciso resgatar os valores perenes por meio das artes, e fazer isso sem se tornar partidário ou ideológico, ou seja, sem cometer o mesmo equívoco da esquerda.

Wolfe fez campanha para Reagan, e depois se decepcionou muito com vários colegas conservadores que se mostraram hipócritas, disputando cargos no governo que antes desejavam reduzir. Foi essa decepção que o fez se voltar mais para esses aspectos duradouros da cultura, em vez da política. Não sou tão radical, pois entendo que a política é crucial, normalmente para se impedir alternativas desastrosas.

Mas os conservadores fariam bem em lembrar que jamais deveriam idolatrar políticos, transformá-los em mitos, ou substituir os princípios por interesses imediatistas eleitorais. No longo prazo, é o foco na cultura que fará toda a diferença. Podemos usar as armas disponíveis para impedir o pior na política, mas façamos isso conscientes do que é realmente essencial.

Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.
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