Sonho? Há pessoas que veem as coisas que existem e se perguntam: por quê? Vamos pensar naquilo que não existe e nos perguntarmos: por que não?

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Acostumados a séculos de pestilência, os ingleses nem se preocupavam mais com a água do Rio Tâmisa. Só tomavam cuidado para não cair nela pois urticárias, coceiras e infecções na pele certamente não tardariam. Um dia, na década de setenta, um jornalista mais atento notou que havia um pescador na margem do rio lançando sua linha e descobriu que os peixes haviam reaparecido depois de muitos anos de prudente ausência. O controle da poluição havia começado a mostrar seus frutos.

Pois é, alguns peixes começam a aparecer na poluída e maltratada baía dos serviços públicos. Já se pode imaginar que recorrer a um serviço governamental não signifique necessariamente passar horas em filas intermináveis, ser tratado de maneira pouco cortês e pouco profissional, ou ter de insistir para ver direitos elementares assegurados. Nas últimas semanas, precisei fazer várias coisas que não são exatamente simples e, em alguns casos, tive uma surpresa agradabilíssima. Em outros casos, tive a agradabilíssima surpresa de ver que os padrões de qualidade já alcançados continuam a existir.

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No primeiro caso, está o recadastramento eleitoral que fiz em exatos sete minutos, do qual saí com o título novo, tudo resolvido. Ou o cadastramento na ParanaPrevidência, que esqueci de fazer e que, quando fiz, descobri que era rápido e eficiente. Em outros casos, a surpresa foi (como dizia o slogan de uma cadeia de hotéis americanos) não ter surpresas: a seção de passaportes da Polícia Federal e a renovação da carteira de motorista no Detran continuam a funcionar muito bem.

Há muitos outros exemplos de melhorias significativas no serviço público, embora essas áreas de excelência ainda sejam um pequeno arquipélago vizinho a um continente de maus serviços e maus-tratos ao cidadão. Em todos os bons exemplos, porém, estão presentes alguns fatores: o uso inteligente da tecnologia, a existência de pessoal treinado e motivado; e a blindagem contra a politicagem e o clientelismo miúdo que fez com que o Brasil se transformasse no paraíso dos despachantes, dos facilitadores que conhecem os meandros da burocracia oficial e se dispõem a substituir o cidadão nessa via dolorosa que é recorrer ao governo para alguma coisa.

Donald Schon, um grande especialista em mudanças organizacionais, afirma que para que haja avanços é preciso associar três coisas: uma mudança das teorias dominantes; uma modificação das estruturas que prestam os serviços; e, cada vez mais importante no mundo contemporâneo, a adoção de novas tecnologias. Alterar as teorias significa mudar a forma pela qual se entende o problema que se quer resolver; a Justiça Eleitoral é o exemplo mais flagrante. Eleições no Brasil eram coisas complicadas, com filas nas secções eleitorais, dias e dias de apuração manual, um sistema lento, inseguro, ineficaz. A partir do momento em que a tecnologia da informação foi utilizada de maneira agressiva e inteligente, o tratamento das eleições e dos eleitores mudou da água para o vinho. E, suspeito, quando os sociólogos se debruçarem sobre os resultados eleitorais das eleições mais recentes, irão se surpreender com variações abruptas de desempenho dos candidatos e dos partidos, antes e depois das apurações que deixaram os ambientes enfumaçados e inseguros do passado e passaram a ser feitas imediatamente e às claras. Algumas carreiras políticas certamente perderam seu dinamismo anterior. Em síntese, não é suficiente modernizar a tecnologia, é essencial modernizar a cabeça dos governantes.

No mundo, já existem "prefeituras" e "governos de estado" vir­­­­tuais que trabalham 365 dias por ano, 24 horas por dia. Caso o paciente leitor queira fazer a experiência, entre no site de Hong Kong, onde praticamente tudo que envolve o governo pode ser feito sem a presença física do cidadão. Em outros casos, até o exercício da cidadania eleitoral é possível via computador; na In­­­­glaterra, já existem distritos eleitorais em que se vota pela Internet.

Sonho? Há pessoas que veem as coisas que existem e se perguntam: por quê? Vamos pensar naquilo que não existe e nos perguntarmos: por que não?

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Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR.