A política transformou-se num espetáculo. A discussão das ideias e dos planos de governo sucumbiu às interdições da ditadura politicamente correta e às regras ditadas pela produção de um show. Temas relevantes para o futuro da sociedade primam pela ausência. Não se discute, por exemplo, um projeto sério para a segurança pública, não obstante a surpreendente desenvoltura das facções criminosas. Assistimos, todos, ao jogo do marketing político. Enquanto isso, caro leitor, a violência avança impune e o seu principal estopim – o mercado das drogas – continua fora da agenda pública.
As consequências da assustadora escalada das drogas podem ser comprovadas nos boletins de ocorrência de qualquer delegacia de polícia. De fato, o tráfico e o consumo de drogas estão na raiz dos roubos, das rebeliões nos presídios e da imensa maioria dos homicídios.
Multiplicam-se, paradoxalmente, declarações otimistas a respeito das estratégias de redução de danos. O essencial, imaginam os defensores da nova política, não é a interrupção imediata do uso de drogas pelo dependente, mas que ele tenha uma melhora em suas condições gerais. A opção pela redução de danos pode ser justificada em determinadas situações, mas não deve ser guindada à condição de política pública.
Mas os “vanguardistas” não desistem. Defendem, irresponsavelmente, a criação de locais especiais de “uso seguro” das drogas para dependentes graves. Nesses espaços não haveria repressão ao consumo. Os viciados seriam estimulados a substituir drogas pesadas por outras supostamente leves, como a maconha. A pretensa inocuidade da maconha termina, frequentemente, no sequestro da esperança e do futuro.
Transcrevo o depoimento de um adicto recuperado. Ele fala com a força e a sinceridade de quem esteve no fundo do poço: “Sou filho único. Talvez porque meus pais não puderam ter outros filhos, me cercavam de mimos e realizavam todas as minhas vontades. Aos 12 anos comecei a fumar maconha, aos 17 comecei a cheirar cocaína. E perdi o controle. Fiz um tratamento psiquiátrico, fiquei 9 meses tomando medicamentos e voltei a fumar maconha. Nessa época já cursava Medicina e convenci meus pais de que a maconha fazia menos mal que o cigarro comum. Meus argumentos estavam alicerçados em literatura e publicações científicas. Eles mal sabiam que estavam sendo enganados, pois além de cheirar, também passei a injetar cocaína e dolantina, que é um opiáceo. Somente a sobriedade total, inclusive do álcool, me devolveu a qualidade de vida que não pretendo trocar nem por uma simples cerveja ou uma dose de uísque.” A.S.N., médico, ex-interno da Comunidade Terapêutica Horto de Deus, Taquaritinga, São Paulo.
Observa-se, na contramão da realidade, um crescente movimento a favor da descriminalização das drogas, sobretudo da maconha. Bandeira frequentemente agitada em certos setores do entretenimento e em alguns redutos de profissionais da saúde pública, a descriminalização não ajudará nada. Ao contrário. Como afirmou o respeitado psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), “os artigos recentes mostram de uma forma inquestionável que o consumo de maconha aumenta em muito o risco de os jovens desenvolverem doenças mentais. Do meu ponto de vista essa geração que consome maiores quantidades de maconha do que a geração anterior pagará um alto preço em termo de aumento de quadros psiquiátricos”, sublinhou o especialista.
A verdade precisa ser dita. Não se pode sucumbir à síndrome da avestruz quando o que está em jogo é a vida das pessoas. O hediondo mercado das drogas está dizimando a juventude. Ele avança e vai ceifando vidas nos barracos da periferia abandonada e no auê dos bares e boates frequentados pela juventude bem-nascida. Movimenta muito dinheiro. Seu poder corruptor anula, na prática, estratégias meramente repressivas. A prevenção e a recuperação, únicas armas eficazes a médio e longo prazos, reclamam um apoio mais efetivo do governo e da iniciativa privada às instituições sérias que lutam pela reabilitação de dependentes.
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