Os teóricos do fim do mundo pela exaustão dos recursos naturais talvez tenham errado na dose, mas não na direção. O mundo continua a tratar os recursos naturais com despreocupação
Nos anos 70 do século que passou, Marshall McLuhan, o filósofo da comunicação global, prognosticou que o mundo se tornaria uma grande aldeia na medida em que as comunicações entre as pessoas se tornassem fáceis, baratas e instantâneas. A profecia do professor canadense em um mundo pré-internet era debatida com paixão por adeptos e adversários.
O livro 1984 de George Orwell também despertou grandes polêmicas, adesões irrestritas e desprezos intelectuais insuperáveis desde seu lançamento em 1949. A visão do mundo totalitário assustava a humanidade, cansada da guerra, confiante de que estava livre das tiranias e de que o Big Brother, a novilíngua e a servidão modernas eram, apenas, arroubos literários de um escritor exótico.
Os teóricos da exaustão dos recursos naturais, Donella Meadows e seus companheiros do Clube de Roma, Paul Ehrlichmann, que prognosticou a bomba populacional, Nicholas Georgescu-Roegen, William Ophuls e muitos outros que lançaram sobre a questão energética uma visão alarmante ou alarmista segundo seus críticos também provocaram frissons e debates acalorados nos anos 70 e 80.
De repente, todos ou quase todos saíram de moda, quando os computadores poderosos cada vez mais baratos e os avanços da ciência reafirmaram nas pessoas a sensação de que nada de mal poderia lhes acontecer, pois, em qualquer caso, os deuses da tecnologia viriam em seu socorro. No entanto, nos últimos tempos, essas certezas confortadoras começam a ruir rapidamente. A aldeia global virou realidade, mas não na direção benigna que McLuhan imaginava de um mundo solidário. O mundo está realmente integrado por um sistema de comunicações que faz com que nos sintamos todos como participantes das mesmas realidades. Tudo o que se passa no mundo passa também na CNN; a celebridade instantânea e planetária virou uma realidade. Mas tanta simultaneidade assusta, pois age como um elemento infeccioso: as crises de um lugar do mundo se espalham rapidamente de maneira incontrolável pelo resto do planeta, epidemias viram pandemias; nas crises financeiras, por exemplo, os mercados reagem de maneira articulada, magnificando os problemas e espalhando perdas mundo afora. O tal Efeito Orloff, de que falávamos, agora é global: todos são todos na ressaca do dia seguinte.
George Orwell era um visionário? Dificilmente, quando se sabe que, hoje em dia, a posse de um mero telefone celular ligado em seu bolso revela para as companhias telefônicas, para a polícia, para os donos de restaurantes e de lojas comerciais, onde você se encontra a qualquer momento. A polícia pode rastrear onde você passou pelas as antenas que seu celular contactou, o Estado pode facilmente descobrir onde e com quem você esteve, o "mercado" sabe onde deve procurar você para atraí-lo ao consumo.
Os teóricos do fim do mundo pela exaustão dos recursos naturais talvez tenham errado na dose, mas não na direção. O mundo continua a tratar os recursos naturais com despreocupação, o lixo se acumula, e agora a incorporação de bilhões de chineses e indianos ao mercado de consumo ameaça acelerar o processo de degradação de maneira fatal.
Curiosamente, os grandes profetas acertaram ou chegaram perto nas grandes questões de longo prazo, mas não conseguem ver o que está mais à mão. Economistas erram sistematicamente em suas previsões financeiras, cientistas políticos são surpreendidos a cada momento... Quem previu que um país profundamente racista até 50 anos atrás como os Estados Unidos teria um presidente negro tão cedo? Que, aliás, só foi identificado assim até ser eleito, pois agora ninguém mais se lembra de que cor tem sua pele.
E quem imaginaria que o Brasil, que há pouco mais de duas décadas estava marginalizado do mercado financeiro mundial por não pagar nem visita de pêsames, teria hoje quase 350 bilhões de dólares de reservas internacionais, a quarta maior do mundo? Neste caso é até desculpável: se um futurólogo previsse isso, seria imediatamente tratado como um louco irrecuperável ou um idiota completo.
Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR.
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