Brasileiros apaixonados por futebol são diariamente lembrados, desde alguns anos, de que o futebol brasileiro precisa se adequar ao "padrão Fifa", um conjunto de regras determinadas pela organizadora da Copa do Mundo, que regula como devem funcionar estádios, contratos e até mesmo o comportamento do torcedor. É evidente que estas práticas não estão de acordo com a tradição brasileira de arquibancadas: torcedores que pulam e gritam, empunhando bandeiras. O fenômeno não é só nosso: ocorre em todos os países latinos, africanos e em boa parte dos europeus (vide as stehplätze do futebol alemão).

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Mesmo com evoluções recentes, a experiência do torcedor "padrão CBF" é geralmente marcada por filas nas bilheterias e no acesso a bares, banheiros sem torneiras e segurança policial à base de cassetetes. Nesse cenário de desordem, a consolidação das torcidas organizadas se deu como uma forma de organizar o acesso a vantagens para uma minoria. Na falta de ação dos clubes, alguns torcedores fiéis buscaram e conseguiram suas demandas à força.

No conjunto de soluções apresentadas para encerrar os casos de violência no futebol, cotidianamente é citada a extinção das torcidas organizadas. O que se deveria pensar não é apenas em legislar sobre limites ao comportamento de uma minoria com liderança clara e violenta, mas em definir os direitos e deveres aplicáveis a todos os torcedores, de modo a formular políticas públicas eficazes.

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É digna de debate a tese defendida por lideranças militares, segundo os quais a organização da segurança interna de um evento é uma atribuição dos seus organizadores. No entanto, a responsabilidade sobre o monitoramento de torcedores no espaço urbano e a manutenção da ordem em caso de sua ruptura (inclusive dentro do estádio) também recaem sobre a segurança pública. A efetiva detenção dos suspeitos e o início do processo são fatos raros atualmente. Os clubes de futebol evitam registrar ocorrência policial, uma vez que existem relações pessoais entre os cartolas e diretores de torcidas.

Supondo a extinção das torcidas, mesmo sem sede, camisas, faixas, instrumentos ou bandeiras, a torcida organizada (como coletivo de indivíduos) não se desintegrará por mágica. Seus membros continuarão se reunindo dentro e fora dos estádios, se deslocando de forma conjunta e entrando em conflito entre si.

Não se conterá a ação violenta de um grupo de indivíduos sem que se preveja punição individual dura. É exatamente na execução dessas punições que se encontra a parte relevante da solução para a violência nos estádios. O torcedor que comete um crime deve ser tratado como criminoso. Deve ser afastado do grupo, seja por prisão ou pela mera exigência de que se apresente para realizar trabalho social nos horários de partidas do seu time. Mais ainda: o clube de futebol deve ser proibido de subvencionar grupos de torcedores.

Dissolver as torcidas organizadas é uma falsa solução. Um ato simples, populista e midiático, mas ineficiente. Não altera o comportamento dos membros da torcida e elimina também o aspecto de uniformidade, que facilita a identificação desses indivíduos como subgrupo por câmeras de vídeo e por outros torcedores.

André Bastos, sócio-contribuinte do Santos Futebol Clube, é professor de Economia na Universidade Federal de Goiás (UFG).

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