Já escrevi anteriormente sobre as mazelas dos carreadores asfaltados, no Paraná chamados de rodovias, nos quais se cobram as maiores tarifas de pedágio do país. Não limitei o articulado à mera narrativa factual, enveredando pela proposição de algumas balizas operacionais e financeiras que, de contractu ferendo, devem estar normatizadas como obrigação das futuras concessionárias após a licitação de 2021. Entre os temas, propus a publicação dos dados sobre a sinistralidade e letalidade das estradas, além do estabelecimento de metas de redução de ambos os indicadores ao longo do tempo da concessão, em combinação com o incremento da velocidade média. A suma é que em estrada boa há velocidade e poucas mortes.

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A Gazeta do Povo publicou, em 23 de setembro, dados sobre a proeminência do Paraná no número de pedestres mortos em rodovias federais em 2014. O estado de São Paulo tem quatro vezes a população do Paraná, milhares de quilômetros de rodovias a mais e, nesse quesito, está em segundo lugar. Aqui, ocorrem quase 12% das mortes por atropelamento do Brasil; os paulistas ficam com 11%.

Proporcionalmente, o topo do pódio da sinistralidade e letalidade das estradas é nosso

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São Paulo tem mais estradas, mais carros, velocidade média muito mais alta do que a nossa; e lá morre menos gente. São Paulo tem 22% da população brasileira; o Paraná, 5,5%. Se as nossas estradas tivessem a qualidade das de São Paulo, morreriam quatro vezes menos pessoas aqui. Segundo dados da Polícia Rodoviária Federal, em 2014 morreram nas estradas federais que cortam o Paraná 777 pessoas. Se tivéssemos vias boas, teriam morrido no máximo 194. O que dizer às famílias das 583 pessoas que faleceram apenas porque não houve investimento para melhorar as estradas, embora o dinheiro exista em abundância no cofre das concessionárias?

Continuando com os números, entre os cinco estados campeões de acidentes e mortes em 2014, o Paraná é o terceiro em mortes (777), mas o segundo em acidentes (17.157), ficando atrás de Minas Gerais, que teve 22 mil acidentes e quase 1,2 mil mortos. Insta dizer que o território de Minas é três vezes maior que o do Paraná e a população é o dobro da nossa. Proporcionalmente, o topo do pódio da sinistralidade e letalidade das estradas é nosso. Os paranaenses morrem nas rodovias mais do que os outros brasileiros porque são maus motoristas? São Paulo, lembremos, está fora desse pódio de acidentes e óbitos.

O Paraná registra 10% dos acidentes rodoviários ocorridos no país a cada ano. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) diz que cada um deles custa cerca de R$ 73 mil aos cofres públicos e da Previdência Social. Naqueles em que há morte, o custo médio sobe para R$ 650 mil. Os 583 paranaenses que morrem por causa da precariedade das rodovias custam quase R$ 500 milhões por ano. Os outros acidentes não letais custam R$ 1 bilhão anual.

Sem avançar na teoria da responsabilidade administrativa, é fácil perceber que, no mínimo, o custo público dos atropelamentos deveria ser cobrado das concessionárias. Estradas em zona urbana, sem cruzamentos em desnível e bloqueios para impedir travessias perigosas, caracterizam nítida incúria de quem tem o dever de velar pela estrada e seus usuários.

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A cobrança de pedágio no Paraná está prestes a completar duas décadas. Não existe a desculpa de “herança maldita” recente. As coisas estavam ruins antes do pedágio e permanecem péssimas muito tempo depois dele.

Além da questão humanitária que salta aos olhos – evitar sofrimento que pode ser evitado –, a alta sinistralidade e letalidade empobrece o Paraná, enviando para o cemitério pessoas vigorosas, produtivas. A dilaceração emocional de famílias, cônjuges viúvos, filhos órfãos, genitores sem filhos, não tem preço econômico. Contudo, o fel da tristeza que milhares de paranaenses experimentam todos os anos está longe de ser sina, danação eterna. Basta decisão política de levar as estradas do Paraná a patamares civilizados, com indicadores de qualidade claros, de conhecimento e aferição pública.

Valeu a pena a emancipação em 19 de dezembro de 1853, ou teria sido melhor permanecer como Quinta Comarca?

Rosane Kolotelo, advogada e professora de Direito, é doutoranda na Universidade de Lisboa.