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Há 1.393 anos, começava a contagem de tempo muçulmana. De lá para cá, muita areia passou debaixo da ponte desta religião do deserto, hoje espalhada por todo o mundo. Primeiro, ainda na vida de seu fundador, o que hoje chamamos de Oriente Médio – a região imediatamente além das fronteiras romanas, periferia em que se mesclavam judaísmo rabínico, cristianismo heterodoxo e paganismos locais – foi conquistada pela espada. De lá para cá, seus sucessores tomaram toda a orla do Mediterrâneo, inclusive a Península Ibérica, só totalmente reconquistada pela Cristandade em 1492.

Foi, todavia, o contato entre a modernidade europeia e o desejo de renovação no interior do Islã que veio a fazer surgir os movimentos que hoje fazem com que muitos associem imediatamente Islã e terror. O Islã, como o judaísmo rabínico, é uma religião total: há regras para tudo, desde como fazer a higiene pessoal até o modo de dividir uma herança ou punir cada tipo de crime. No Islã, a ordem social e a ordem religiosa são uma só coisa, desde o seu início. Maomé era líder guerreiro, governante e líder religioso, tudo ao mesmo tempo. Não faria sentido, no Islã, dizer “a César o que é de César”: tudo é de Alá. Há, lá, todavia, uma peculiaridade: ao contrário do judaísmo, é uma religião universalista. Todos são chamados, e quem entra não tem mais o direito de sair.

No Islã, a ordem social e a ordem religiosa são uma só coisa, desde o seu início

A modernidade europeia, que conhecemos melhor pelas ideologias – como o comunismo e o nazifascismo – que se enfrentaram nos campos de batalha e chacinaram as próprias populações no seu auge, no século passado, também se queria uma solução integral. Cada uma de suas formas também se percebia como universal, como o futuro da humanidade.

Quando o Islã e a modernidade se encontraram pelas mãos de Napoleão no Egito, de início pareceu que era água e vinho. Mas não: era a fome com a vontade de comer. O modelo universalista e total da modernidade encontrou, no que inicialmente pareceu aos europeus um pântano estagnado, o manual completo de vida e adequação a uma ordem exógena que seus próprios teóricos nunca conseguiram produzir. As releituras do Islã, apresentadas como voltas às fontes e a uma suposta pureza original, conseguiram criar uma ideologia quase monolítica, que com o apoio britânico e posteriormente americano a seus patrocinadores sauditas veio a ser apresentada por quase toda parte como a própria definição daquilo que jamais existira: uma pura ortodoxia islâmica.

Este Islã, dito salafista, é uma ideologia totalitária, uma receita de bolo para a sociedade como um todo, muito mais semelhante ao comunismo ou nazifascismo que ao cristianismo, judaísmo, budismo, espiritismo ou hinduísmo. O problema não são as pessoas, mas a ideologia.

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