É interessante observar que Jesus, ao fazer ou dizer alguma coisa muito importante, sempre sobe a um monte. A última tentação acontece num monte; as bem-aventuranças são pronunciadas numa montanha; num monte são multiplicados os pães, e, no fim do Evangelho, quando os discípulos encontram o Ressuscitado e são enviados para o mundo inteiro, encontram-se "na montanha que lhes fora indicada". Por que tanta insistência com a montanha? Não será, por certo, para nos dizer que Jesus e os discípulos, de vez em quando, saíam para respirar as frescas brisas.
Quem no Antigo Testamento subia à montanha? Era Moisés. Foi no alto da montanha que ele recebeu a revelação de Deus, que depois transmitiu ao povo. Há mais, se lermos Ex 24, veremos que também dele se diz que subiu "após seis dias" que não foi sozinho, mas que tomou consigo dois discípulos e que foi envolvido por uma nuvem. Na montanha sua face também foi transfigurada pela luz da glória divina (Ex 34,30). Está claro agora o que o evangelista Mateus nos quer dizer? Quer nos apresentar Jesus como o novo Moisés, como aquele que dá ao novo povo, representado pelos três discípulos, a nova lei, a revelação definitiva de Deus.
Na transfiguração, como nos conta o Evangelho de hoje, Jesus toma a iniciativa e se manifesta sob outra forma, que revela o seu verdadeiro ser, sua majestade divina, concede aos apóstolos contemplar o fim que o espera. Assim, os discípulos podem ver que o Servo repelido e incompreendido é o Filho do homem. A condição humana, frágil e oculta, é apenas um tempo de passagem, um parêntesis. Com essa antecipação da glória de que se resistirá no momento da ressurreição, a fé dos discípulos deveria ser reanimada, confirmada.
Os futurólogos nos dão a imagem de um mundo que se assemelha a uma "cidade" cujo crescimento demográfico é rápido, as cidades aumentam e absorvem os povoados vizinhos. Caminhamos para "a uni-cidade", para um novo mundo-cidade. Mas que forma deve assumir? Que deve ela tornar-se para não ser um uniforme formigueiro? Nossa liberdade de construir está realmente em condições de construir? Quando se coloca o problema da realização futura, as trevas caem sobre nós.
Estamos diante de um dever que é muito mais obscuro do que se pode pensar; nossa fé vacila. Nossa fé não nos diz nada mais do que isto: para adotar as opções que nos permitem obter o sucesso é necessário abrangermos os dois extremos da história e podermos concentrar num instante o passado e o futuro. Este é o risco que a fé comporta. O cristão decide viver nesse risco. Sente a obscuridade que pesa sobre todos os homens na construção do presente, e não se assusta, não tem medo porque vê a meta, o Cristo transfigurado.
Dom Moacyr José Vitti CSS, arcebispo metropolitano.