A civilização euro-ocidental nasceu na península grega: mitos, idiomas, modo de ver e viver o mundo, prosa, poesia, teatro, instituições políticas. Esparta e Atenas se tornaram referência para belicosos e pacifistas. Escultores, filósofos, geômetras, médicos, arquitetos, físicos, astrônomos das paleo-academias espalhadas pelo Oriente Médio, norte da África, Sicília, são reverenciados pelos seus pares até hoje. Mesmo na modernidade fobosófica que tem horror ao conhecimento ao buscar argumentos de autoridade, vem à tona um nome grego. Sócrates, Platão e Aristóteles compõem a tríade dos sábios que todos citam e poucos entendem ou localizam no calendário. A Grécia está no nosso DNA cultural. Somos gregos até os ossos.
Os romanos invadiram a península e se aculturaram, tornando-se greco-romanos. Ter escravo grego como preceptor dos filhos denotava status social mais relevante do que ter biga com quatro cavalos, fosse Lamborghini ou Ferrari. Para os romanos, a Grécia era cult. Dominadores na espada e dominados nas letras, os centuriões e generais romanos unificaram a Europa sob a cultura que vinha do Mediterrâneo.
General de outras batalhas, Paulo de Tarso passou pelas cidades gregas, na sua jornada a Roma, e pregou a palavra de um palestino desconhecido, deixando registro em epístolas aos fiéis por onde passara. Os nomes dessas cidades estampam missais nas homilias que vibram as almas carolas. Somos gregos até a alma.
O Império Romano feneceu pela espada dos germanos. De novo, o vencedor se rendeu à cultura do vencido e se tornou romano-germânico. Diga-se a parte mais grega do que era Roma permaneceu politicamente viva até 1453, quando Constantinopla sucumbiu aos otomanos. Vitoriosa nas letras, a Grécia mítica sobreviveu nas pinturas, esculturas, desenhos, ideias de Leonardo, Rafael, Donatello, Michelangelo. O sonho da beleza áurea, dos ângulos perfeitos, das colunas imitadas à exaustão, da paixão pelo conhecimento organizado em bibliotecas, da busca da verdade em dialética infinita moveu o pensamento dos europeus e seguiu seus barcos pelo mundo. Pela última flor do Lácio, o Português, idioma sequer imaginado nas aulas peripatéticas de Aristóteles, a mundivisão grega cobriu o planeta. Depois, outras línguas europeias completaram o processo. Somos gregos até a língua.
Europeus inimigos da Europa tantas guerras fizeram entre si que quase destruíram a identidade cultural. Desorientada como Heitor depois de topar numa pedra, a Europa estava exangue e prestes a sucumbir à sanha de dois Aquiles que se levantaram a leste e oeste. Estados Unidos e Rússia, vitoriosos na guerra, pensaram lidar com despojos. Surpreendentemente a Europa buscou seu passado e ressuscitou, colando os caquinhos para formar o mosaico bizantino que trouxe belas imagens de paz e progresso.
A Paneuropa agora sofre fissuras causadas pela Grécia. O sonho da unidade em torno da identidade greco-romano-germânica desmorona ao tremor das passeatas nas ágoras de Atenas. As eleições em meados de junho revelarão políticos à Péricles ou já se pode encomendar a lápide em cujo epitáfio se dirá: aqui jaz um sonho.
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