As bolsas de valores em declínio, bancos à beira da bancarrota, gregos vivendo a tragédia depois da bonança, franceses angustiados (mais do que o usual) com a previsível falência da previdência social, espanhóis estudando português para trabalhar no Brasil. Migrantes brasileiros voltando para escapar da indigência chique em Paris. A Europa parece uma família rica, com muitos membros pródigos e poucos prudentes; vai indo, vai indo, todos entram em linha descendente tentando manter a pose. Tudo era sólido e está se desmanchando no ar do Velho Mundo. A sensação de fim da montanha russa depois da autodissolução soviética e a convicção de que a União Europeia se consolidaria como a maior potência econômica mundial, retomando a condição de locomotiva intelectual da humanidade, durou pouco. Foi um belo sonho, servindo como paradigma para mobilizar esforços na construção do Mercosul, mas o sonho sempre acaba.
O Estado do bem-estar, invenção europeia, tudo provê e assegura o indivíduo do berço ao túmulo contra todas as agruras, dando saúde, educação, emprego, lazer para todos. Quanto custa? Ora, que deselegância falar de dinheiro à hora do banquete, parece coisa de pobre! Aposentadorias precoces com salários altos, seguro desemprego quase vitalício, bolsa spa para tratamento de estafa de quem trabalha e tédio de quem está ocioso. Alguém paga por isso e, quando não há mais condições para financiar a dívida pública provocada por esses custos, o ponto da goiabada desanda. A hiperproteção do Estado afrouxou a vigilância individual diante das surpresas da vida, a exemplo da quebra de bancos: se o governo garante, não é preciso se preocupar com a reputação do banqueiro. A inocência quase ingênua, a perda do espírito animal, é campo fértil para os estelionatários elegantes, cujas falcatruas são cobertas com dinheiro público. De certa forma, ao fim e ao cabo, o engodo é generalizado e o próprio governo, a exemplo da Grécia, passa a mascarar a contabilidade para alongar o idílio. As passeatas contra a austeridade são tolas; a rigor, dever-se-ia estar na a rua exigir a punição dos políticos irresponsáveis que permitiram a bancarrota. Mas ninguém quer pagar a conta no fim da festa.
O enfraquecimento da Europa é parte no novo cenário cacofônico que se avizinha. Alguma coisa está fora da ordem, é a nova desordem mundial, na qual desaparecem a coerência e a constância que confirmavam expectativas e davam sensação de conforto diante das incertezas do futuro. Esse mundo simples, duocêntrico, acabou em 1989; o monocêntrico, em 2009 na crise imobiliária norte-americana. China, Irã, África do Sul, Índia, Brasil se apresentam no tabuleiro com a pretensão de valerem mais que peões e as outrora peças fortes do jogo Japão, Europa, Rússia, Estados Unidos não conseguem dar xeque-mate. O poder, nas suas várias expressões, não é perene. Mantê-lo é tão extenuante quanto conquistá-lo. Ao menor descuido, ele escapa para as mãos de outro titular. O policentrismo é confuso, agitado, criador de oportunidade e perigos difíceis de prever com margem razoável de acerto. Ao canto Caetano, não há de se esperar que todos os homens concordem, basta apreciar as diversas harmonias bonitas sem angústia com o juízo final nessa nova ordem mundial.
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