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Algumas pessoas bradam furiosas, ficam com aparência febril de raiva, quando falam sobre a qualidade ética e técnica dos políticos brasileiros. Em quem os nervosos votaram? Melhor ainda: os nervosos participam do processo político ou deixam vácuo? A valentia e honestidade etílicas nos churrascos de sábado é enfadonha. As respostas prontas para resolver todos os problemas do Brasil revelam espírito autoritário, com afirmações sobre cadeia para todo mundo, cassar mandatos, banir corruptos. Finda a bravura verbal, tudo volta ao que era antes no quartel de Abrantes. Esses arroubos não fazem a democracia. As instituições a fazem. Construir instituições é trabalho difícil, demorado, que combina conhecimento científico, arte e paciência.

O tema deixou nervos à flor da pele por ocasião da recente decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a aplicação da Lei da Ficha Limpa para 2012, tendo em vista o artigo 16 da Constituição Federal que diz não se aplicar imediatamente lei que inova o processo eleitoral a me­­nos de um ano da data da votação. O Tribunal se dividiu em seis a cinco pela inaplicabilidade da Lei à eleição de 2010. Muita gente exclamou que o mal venceu o bem! Inocente maniqueísmo que remete à tirania dos moralistas, extremamente opressiva porque feita sob a justificativa de que a finalidade é boa, livrando o opressor dos dramas do remorso.

Os argumentos pela aplicação imediata da inelegibilidade dos fichas-sujas, rompendo o princípio da anterioridade de pelo menos um ano, eram respeitáveis e de grande envergadura jurídica e moral, mirando fortemente a probidade como requisito para qualquer cidadão se apresentar diante da sociedade como candidato a cargo público eletivo. Pela perspectiva jurídica havia o argumento de que a elegibilidade não integra o conjunto que a Constituição Federal denomina de "processo eleitoral". A posição majoritária, que não foi a favor da improbidade, assentou-se no entendimento de que a exclusão de candidaturas, quando já aberto o período eleitoral, viola a garantia constitucional da anterioridade.

A escolha ocorreu entre dois valores importantes: barrar os candidatos fichas-sujas já e abrir precedente para que no futuro o processo eleitoral possa ser modificado com as eleições em andamento ou valorizar o princípio da anterioridade anual, admitindo os fichas-sujas na eleição de 2010 e consolidando o precedente de que não se muda a regra do jogo em andamento. O tema pode ser apresentado como troca intertemporal: vantagem agora e problema no futuro; problema agora, benefício no futuro. É igual à poupança; privar-se agora para ter tranquilidade depois ou desfrutar imediatamente e mais adiante ver como fica.

Considerando o histórico de mudanças súbitas das regras do jogo eleitoral, a exemplo da ocorrida em 1981, que obrigou o Partido Popular a se incorporar ao PMDB, penso que o melhor é ter segurança para o futuro. Nas eleições parlamentares da Venezuela, em 2010, as leis mudaram perto da data da eleição para evitar que a oposição se tornasse maioria no Parlamento. A decisão do Supremo Tribunal Federal é relevante para a consolidação da democracia brasileira porque o problema dos desonestos disputando eleições é conhecido, já sabemos lidar com ele, e haverá fim nas vindouras, mas não teremos nunca mais o comportamento de república de banana de fazer leis eleitorais para assegurar vitória do governo.

A troca intertemporal foi positiva porque ficamos com data certa para extinguir um problema e consolidamos a lisura das eleições futuras, nas quais não haverá fichas-sujas e nem mudança repentina da regra do jogo.

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