O Brasil emprestou 10 bilhões de dólares ao Fundo Monetário Internacional (FMI); o Brasil está cobrando pedágio de 2% para ingresso de capital estrangeiro. São notícias recentes, do mês. Para os jovens esses fatos passam em branco, como algo corriqueiro, mas a memória da recessão de 1981, da moratória da dívida externa em 1987, das passeatas ao som "FMI, fora daqui!", faz quase surreal a nova situação, na qual a palavra de ordem seria: "FMI, é aqui!". Hoje o Brasil é credor do FMI; dinheiro dos tributos que pagamos ao governo foi cedido em empréstimo ao Fundo; valor alto, equivalente ao orçamento anual do Paraná. Seria muito interessante se algum país devedor, diante de passeata contra o pagamento da dívida externa, decidisse pela moratória e nós ficássemos na posição de credor caloteado. Findaria nossa adolescência institucional e o doce prazer da irresponsabilidade de acusar os credores pelas agruras do devedor.
A passagem tão rápida da situação de devedor inadimplente a credor ocorreu porque na década perdida os anos 80 chegamos ao fundo do buraco com o confisco da poupança no (des)governo Collor e, depois de feitiçarias econômicas que dependiam mais dos despachos feitos na esquina do que do equilíbrio das contas públicas, se deu início a período de crescente responsabilidade fiscal; significa dizer, gastar conforme o ingresso de recursos, sem fazer dívidas alopradamente, sem a mínima preocupação com as dificuldades para honrar os débitos.
O dinheiro cedido renderá juros e, caso não haja inadimplência, receberemos o capital acrescido dessa renda. Estaremos na posição de capitalistas espoliadores dos povos oprimidos? Ora, os juros são abominados por quem não trabalha para formar massa de riqueza capital representada por algum bem valioso. Intelectuais "progressistas" e religiosos se unem em torno da condenação ao juro, como se fora fruto podre de árvore estéril, o dinheiro. A montanha de recursos que foi entregue ao FMI é fruto nobre do trabalho de milhões de brasileiros que poderiam utilizar essa riqueza para fazer investimentos aqui, incrementando a produção e a qualidade de vida; por opção política, se fez a cessão em empréstimo. Assim, é justo que os tomadores dessa riqueza, que não trabalharam e não pouparam, ao aproveitá-la, paguem por isso.
Em 15 anos de um pouco de responsabilidade fiscal por parte do governo nos três espaços políticos (federal, estadual, municipal), nos tornamos um dos principais destinos do investimento financeiro mundial. Na primeira quinzena de outubro ingressaram quase 11 bilhões de dólares para a compra de ações na Bolsa de Valores, para a compra de títulos da dívida pública da União e para inversões de maturação média a longa, como a criação de plantas industriais. Não houve responsabilidade fiscal com qualidade suficiente para que se possa falar de peito estufado, cheio de orgulho. A política populista, a ocupação do espaço público como se fosse lugar a ser apropriado por interesses momentâneos de poder, persiste como fragilidade relevante, visto que a maioria dos municípios é deficitária, alguns Estados mal e mal conseguem custear a folha de salários e a União tem alcançado superávit com toques de maquiagem contábil ao adicionar reforço de caixa vindo de sociedades de economia mista e empresas públicas.
Ainda assim, apesar do atrapalho do aparato estatal, os empreendedores e trabalhadores brasileiros geram riqueza com tal exuberância que a confiança dos investidores foi se consolidando e os ingressos de capital estrangeiro se tornaram caudalosos. Para evitar inundação de dólares, se criou o pedágio. Quem viu empresas inteiras se converterem numa mala de dólares levada clandestinamente ao exterior, em fuga exasperada do capital, percebe que há novidades no mundo.
Espera-se, não seja apenas mais um caso de amor infinito enquanto dura. Somos responsáveis pelo capital que cativamos.
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