No final do século 19 Émile Durkheim estudou o suicídio e, ao redigir a monografia, construiu o método da sociologia. Para o que tenho em mente interessa o tema escolhido pelo estudioso francês, revelador de problema que tinha relevância social pela quantidade e a frequente imitação que modismos relacionados aos motivos e modos de autoeliminação. Tempos inocentes aqueles dos suicídios que chamaram a atenção da nascente Ciência Social! Hoje a moda dos suicidas é arrastar consigo, para o pó de onde viemos, pessoas escolhidas ao mórbido acaso.

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Doentes mentais, armas poderosas em abundância, fama instantânea, formam quadro perigoso. O senso comum tem a resposta pronta para resolver o problema: basta reduzir ou suprimir um dos componentes da equação e a tranquilidade estará assegurada. Ora, John Nash era esquizofrênico, mas nunca matou ninguém e ainda por cima ganhou o Nobel de Economia pela sua contribuição à Teoria dos Jogos, com o desenvolvimento do raciocínio sobre o equilíbrio na atividade de competidores. A normalidade é difícil de definir objetivamente. A anormalidade é identificável quando se manifesta para construir ou destruir. A diversidade de funcionamentos mentais é parte da riqueza humana. Num mundo absolutamente "normal", a criatividade, a inovação, a invenção, estariam extintas.

Insanos sem armas de fogo são menos nocivos. Portanto, uma política pública orientada para a redução do acesso às armas tem o efeito – não mensurável estatisticamente – de salvar vidas que ficariam à mercê de algum exibicionista amalucado. Pessoas sempre mataram pessoas. Todavia, as ferramentas modernas à disposição permitem que um indivíduo traumatize a vida de centenas. Nesse ponto a ação coletiva deve incidir para reduzir a lesividade desses atos. A diminuição da quantidade de armas de fogo em circulação deve ser atividade contínua do poder público, não apenas para fins midiáticos, oportunistas, post factum. Menos armas poderosas, menos tragédias. Ainda assim, redução do risco, não a certeza de solução do problema.

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Os 220 volts de realidade dessas tragédias eletrizam a opinião pública e o noticiário fica repleto de referências, incluindo desenhos informativos dos passos do maluco sociopata. É verdade que as pessoas normais ficam angustiadas, consomem as informações com voracidade e não pensam em praticar algo parecido. Para quem tem juízo no lugar, a tragédia abre as portas da percepção para a dor das vítimas diretas e todos se sentem vitimados. Contudo, psicopatas veem no alarido estrepitoso os 15 minutos de fama que os sacarão do anonimato e sentem-se emulados para produzir mais espetáculo. Para eles, abrem-se as portas da imitação mimética. Talvez aqui esteja a variável mais controlável da equação. Ora direis, isso é censura. Não, não é isso! Penso que a inteligência jornalística desenvolvida no ambiente das democracia tem condição de refinar o foco do noticiário sem glamourizar o autor da violência. Informar, opinar, discutir, contribuir para a formação de ideias sobre a prevenção da tragédia e tratamento das feridas quando elas ocorrem, pode ser feito sem que o noticiário sirva de estímulo à criação de modismo e, principalmente, o incremento da escala quando a coisa é banalizada. Não se deve cativar a atenção psicótica, no sentido da clássica oração de Saint Exupéry.

Ao ouvir a opinio doctorum de pedagogos, sociólogos, antropólogos, fiquei perplexo com algumas opiniões que isentavam o matador de crianças de qualquer responsabilidade, atribuindo-a àqueles que buliram ou inticaram com ele muitos anos antes nos pátios das escolas; outros atribuíram a responsabilidade difusamente à sociedade. Aos monstros, as suas monstruosidades.