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Seis da matina de segunda-feira, hora de começar a semana, a cabeça ainda meio sonolenta e vem a novidade pela voz de um filho: "Osama morreu!". Semi-consciente, pensei que o presidente dos Estados Unidos houvesse sofrido um atentado. Aí o cérebro começou a funcionar, a confusão sonora entre Obama e Osama se desfez e entendi quem havia matado quem. Apressadamente abri o computador para me informar sobre a notícia e tive o desprazer de ver um dos meus ídolos, Barack Hussein Obama, dizer que havia ordenado ao diretor da CIA "to make the killing or capture" de Osama Bin Laden, que a sua morte deve ser saudada por quem acredita na paz e dignidade humana e que "justice has been done". Preferi manter no original para que o horror dessas assertivas não fosse embaçado pela tradução. Como é que Obama se deixou ficar tão parecido com Osama? Será que ainda estou dormitando e não entendi o que está acontecendo?

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O principal alicerce da democracia é o princípio de que o indivíduo tem direitos que a coletividade organizada na forma de Estado deve proteger em qualquer circunstância, ainda que esse fulano seja bandido da pior cepa. Dentre esses direitos, o mais fundamental é a vida. Por força disso, nunca deve partir de uma democracia a ordem para matar alguém. O presidente de um Estado democrático não recebe procuração do povo para ser facínora durante o tempo do mandato. A investidura de poder se destina à proteção dos princípios que dão razão à existência da comunidade política. A ordem correta seria para capturar Bin Laden e trazê-lo a julgamento no qual fosse garantido o devido processo legal. Conduta civilizada e civilizadora diante do bárbaro que fez barbaridades. A morte do perseguido só tem justificativa como efeito do combate no momento da tentativa de captura, nunca como objetivo da missão.

Atribuir legitimidade à inversão da sequência normal da ação policial do Estado, aceitando que os soldados/policiais tenham como prioridade a morte do indivíduo perseguido, abre perigoso precedente para que o chefe do Estado se torne um capo di tutti capi, mandando matar a seu talante, tal qual os celerados.

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Em segundo lugar, não é digno da civilização saudar a morte violenta de alguém. Mortes sempre são lamentáveis, independentemente da ficha de antecedentes da vítima. Não se faz carnaval de rua para comemorar homicídio. A paz e a dignidade humana ficariam muito mais fortalecidas se Bin Laden fosse julgado de modo imparcial, assegurada a ampla defesa. Haveria motivo para júbilo se, apesar do sofrimento causado por Bin Laden ao povo norte-americano, ele fosse respeitado como pessoa.

Com as devidas adequações, o povo festejando em torno do local onde ruíram as torres lembrou as turbas linchadoras que fazem vingança, não justiça. A vingança não é justa. Ainda que o sofrimento recíproco seja proporcional, falta o sentido pedagógico da afirmação da superioridade dos valores da democracia sobre as baixezas humanas.

Assistindo ao vídeo, vi discurso de candidato à reeleição, não de estadista. É uma pena. O mundo carece de dirigentes que afirmem princípios morais, ainda que o resultado eleitoral dessa postura não seja recomendado pelos marqueteiros. Atender à sanha de vingança dos eleitores empobreceu a biografia de Obama. C’est la vie.