Eu nunca serei igual a meu pai. Nunca chegarei aos pés dele. Tudo que posso fazer é seguir seus passos e tentar imitá-lo. Meu pai era um dos homens mais honestos que já conheci. Jamais desrespeitou a lei, jamais enganou os outros, jamais agrediu alguém, jamais bajulou alguém, jamais ficou com o que não lhe pertencia.

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Honrava todos os compromissos e pagava todos os impostos até o último centavo, com uma escrupulosidade que chegava a ser irritante. Não furava o sinal vermelho, respeitava os pedestres, cedia lugar às mulheres, conversava longamente com os mais velhos, dava esmolas, tratava os mendigos por “senhor” e certa vez caiu em depressão ao ver um homem comendo lixo (depois idealizou uma campanha de combate à fome intitulada “Nesta casa tem um prato de comida”).

Meu pai é meu herói. Nunca ia à igreja, exceto em casamentos e batizados, mas era o homem mais cristão que encontrei. Só de escrever estas palavras sou tragado por uma onda de saudade tão avassaladora quanto a gravidade de um buraco negro.

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É difícil seguir os passos de um pai herói

Comunista (ou pelo menos socialista) na juventude, perdeu os dois melhores amigos – Arno Preis e João Leonardo – na luta armada contra a ditadura. Eles morreram lutando para implantar outra ditadura, mas isso não vem ao caso. A dor de perder os dois amigos marcou profundamente meu pai. Posso dizer que só existo porque ele escolheu formar uma família em vez de pegar em armas.

Virei comunista lendo as edições da Revista da Civilização Brasileira que meu pai guardava na estante de casa. Eram livros tão velhos quanto eu. Mas meu pai foi mudando. Nunca se tornou conservador como eu me tornei – morreu na esquerda –, mas nunca mais votou no PT depois da morte de Celso Daniel e do mensalão.

É difícil seguir os passos de um pai herói. Nosso governador, ao que parece, jamais chegará aos pés do seu pai, José. Mas não quero terminar esta crônica falando de política. Prefiro lembrar a história de um menino criado na cidade de Nazaré, que as pessoas do lugar provavelmente conheciam como Jesus, o filho do carpinteiro.

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Quando ele estava prestes a completar 2 anos de idade, aproximou-se da mãe, Maria, e abriu a boca para dizer sua primeira palavra: “Aba”. Naquele momento, José trabalhava na oficina. Os olhos de Maria encheram-se de lágrimas. Não sei se a primeira palavra de Jesus foi pronunciada em Nazaré ou no Egito, enquanto seus pais estavam exilados para fugir de Herodes. Só sei que muitos anos depois Jesus pronunciaria a mesma palavra durante sua agonia no Horto das Oliveiras: Aba, Pai.