Sempre que faço críticas ao PT, aparece alguém para dizer que não passo de um elitista. E é verdade. Sou da elite que acorda às 5 da manhã e dorme depois das 22, trabalhando o dia inteiro. Pertenço à elite que vai de ônibus para o serviço, porque nunca aprendeu a dirigir. Sou da elite que come arroz e feijão todos os dias. Que conversa com os porteiros. Que lava a louça depois do jantar. Que assiste ao desenho da Peppa com o filho.
Sou daquela elite golpista e pernóstica chamada classe média, que faz das tripas coração para evitar o vermelho no banco. Elite que paga contas cada vez mais altas de água, luz, educação, saúde, condomínio. Elite que luta para não se afogar em impostos e taxas. Elite que se espanta com os aumentos de preços no supermercado, no sacolão, na padaria, no shopping, no restaurante. Que os companheiros me desculpem, mas continuo preocupado com a situação do país. Um elitismo incorrigível da minha parte!
Minha elite é aquela que acha Bach melhor do que samba-enredo. Que considera Eliot melhor que Mano Brown. Que não consegue ouvir funk nem rap. Que não assiste ao Esquenta. Que não sabe o nome dos participantes do Big Brother. Que ainda se lembra de George Orwell sempre que o nome do programa é mencionado...
Sou daqueles reacionários imperdoáveis que ainda acreditam em coisas antiquadas como moralidade
Sou da elite que guardaria dinheiro na poupança – se tivesse dinheiro. Elite que anda pelo Calçadão diariamente, que já comeu muito pastel na feira, que não vive sem tomar uma cervejinha sexta-feira no bar do japonês.
Um de meus mais irritantes hábitos elitistas é percorrer os sebos da cidade atrás de livros que jamais encontro. Mas acabo achando outros livros e os levo para casa – meio escondido da mulher, porque já não tem mais espaço nas estantes. Sou da elite conservadora que ama o cheiro das velhas páginas, percorridas e às vezes anotadas por outras mãos que jamais conhecerei...
Estou entre os 88% de londrinenses elitistas que desaprovam o governo Dilma. Sou da elite que em breve vai sair na rua contra a corrupção e a incompetência dos companheiros. Sou daqueles reacionários imperdoáveis que ainda acreditam em coisas antiquadas como moralidade, receitas e despesas, economia de mercado, liberdade de expressão, respeito à vida humana.
O pior, no entanto, é ser um elitista cristão. Intolerável! Faço parte da elite que acredita em Deus, lê a Bíblia, vai à missa todos os domingos e reza o terço todos os dias. A cada Ave-Maria, penso eu, uma rosa é colocada aos pés de Nossa Senhora. Só mesmo um burguês inimigo do povo para fazer uma coisa dessas. E agora vocês me dão licença, que eu vou brincar de sabre de luz com o Pedro. Gente fina é outra coisa.
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