O governo federal anunciou a meta de déficit primário consolidado do setor público para o próximo ano. São R$ 143 bilhões, somando os déficits do governo federal, dos governos estaduais e municipais, e das empresas estatais. O déficit primário é o saldo das receitas tributárias menos os gastos antes do pagamento dos juros da dívida pública. Num primeiro cálculo, a dívida consolidada do setor público crescerá o equivalente ao déficit primário mais os juros da dívida do governo. Para sustentar esse rombo, a dívida pública terá de crescer em termos porcentuais sobre o Produto Interno Bruto (PIB) o equivalente ao porcentual do déficit primário somado aos juros e descontada a inflação. Isso se explica porque a inflação, ao aumentar os preços dos produtos, faz o PIB aumentar, em valor nominal, o equivalente à inflação média anual refletida no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
O déficit anunciado para 2017 torna-se mais grave quando somado ao déficit primário de 2016, previsto em R$ 170,5 bilhões. Juntando esses dois déficits, mais os juros da dívida dos dois anos e descontada a inflação, o total da dívida pública em relação ao PIB poderá aproximar-se dos 80% (já se fala em 77%, no mínimo). Ou seja, a dívida consolidada do setor público sobre a produção geral do país de um ano chegará perto de 80% do PIB para uma arrecadação tributária em torno de 36% sobre esse mesmo PIB, sabendo-se que a arrecadação bruta é destinada a pagar as despesas do governo e gerar um saldo – que deveria um superávit – para pagar juros e a amortizar a dívida vencida no ano.
Fugir da receita de gestão financeira que dá certo nos países adiantados é inútil
Do ponto de vista da prudência financeira, é uma situação de altíssima gravidade, que precisa ser estancada urgentemente, sobretudo porque a dívida que o governo faz resulta de empréstimos tomados no sistema bancário, cujos fundos dependem dos depósitos das pessoas e das empresas. Se a dívida do governo crescer a níveis superiores à poupança feita pela sociedade, os bancos não terão fundos para financiar o passivo do governo, e as duas saídas alternativas serão o aumento de impostos e a emissão de moeda, ambas indesejáveis e prejudiciais à economia.
Mesmo diante desse quadro grave de déficit, o ex-presidente Lula, a presidente Dilma e o PT andam falando em fazer uma carta à nação afirmando que, se Dilma não for afastada, ela dará uma guinada radical à esquerda e gastará mais. Isso significa desconhecer ou não se importar com o caos nacional que certamente virá de tal prática, como se a economia não tivesse regras nem limites. Políticos e economistas alinhados com o PT já chegaram a dizer que a preocupação com o déficit público é coisa de neoliberal, discurso que, em país adiantado, não se consegue entender e é considerado ridículo.
A realidade é que o Brasil chegou a um ponto em que o setor público precisa fazer cirurgia de redução de gastos – inclusive, por mais que os funcionários públicos gritem, discutir a sério a política de aumentos salariais e benefícios – e reformar todo o sistema de previdência pública e privada, além de outras medidas de reequilíbrio das contas fiscais. Caso a economia se recupere e o PIB volte a crescer, crescerá também a arrecadação tributária, sem esquecer que a própria recuperação depende de que o governo coloque ordem em suas finanças. Fugir da receita de gestão financeira que dá certo nos países adiantados é tentativa inútil de inventar uma fórmula milagrosa à brasileira, que não tem chance de êxito.
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