Alerta geral para todas as embaixadas brasileiras no exterior: o país está sob risco de um iminente golpe de Estado! Que cada posto designe um diplomata para estabelecer o diálogo com a sociedade civil organizada local e, assim, articular a “resistência democrática” contra as investidas do poder econômico e da grande mídia que desejam derrubar um governo eleito pelo povo. Em pouquíssimas palavras, esse foi o teor não de uma, mas de três mensagens enviadas pelos canais oficiais do Ministério das Relações Exteriores no dia 18 às representações diplomáticas brasileiras no exterior.

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O conteúdo, em sua maioria, nem era uma produção original do Itamaraty. A segunda nota reproduzia um texto da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong); a terceira trazia a “Carta aos Movimentos Sociais da América Latina”, documento de ONGs e centrais sindicais, e foi enviada mesmo depois de o secretário-geral do Itamaraty ter desautorizado as duas mensagens anteriores. O responsável pelos alertas, Milton Rondó Filho, diplomata conhecido no Itamaraty como defensor incondicional do governo, foi advertido apenas verbalmente e não pode mais enviar mensagens por conta própria, uma punição branda para o tamanho da confusão que poderia ter causado.

A imprensa internacional já percebeu o tamanho do escárnio que foi a indicação de Lula para um ministério

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Vendo que os trabalhos da comissão do impeachment na Câmara estão em andamento, e percebendo que o discurso surrado que associa impeachment a golpe só prospera nos ambientes já ligados ao governo, o Planalto parece ter decidido que é hora de tentar sensibilizar a opinião pública estrangeira com a mesma lorota. Essa é a explicação para as entrevistas da própria presidente Dilma Rousseff, do ministro Jaques Wagner (Casa Civil) e do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, à imprensa internacional.

Wagner, por exemplo, afirmou que o impeachment só prejudicaria a economia, agravando a crise – faltou combinar com o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, que no mesmo dia anunciou a proposta do governo de reduzir a meta fiscal de 2016 em quase 90% – de R$ 24 bilhões para R$ 2,8 bilhões –, com abatimentos que poderiam levar o resultado final a um déficit primário de R$ 96 bilhões. Também na quarta-feira Lula já deixou claro: a prioridade é salvar Dilma, resolver a economia fica para depois. Ou seja, não é preciso haver impeachment para agravar a crise, pois o próprio governo já vem trabalhando duro para isso.

Na quinta-feira, foi a vez de Dilma receber jornais norte-americanos, europeus e latino-americanos. Repetiu o discurso de que há um “golpe” em curso no Brasil e de que seus adversários usam “métodos fascistas”. Ainda por cima, defendeu a nomeação de Lula para a Casa Civil.

A quem Dilma quer enganar? A imprensa internacional já percebeu o tamanho do escárnio que foi a indicação de Lula para um ministério: o New York Times, presente à entrevista, já havia classificado como “ridículas” as explicações da presidente, e para a Economist essa foi a gota d’água que levou a revista a pedir a renúncia de Dilma. Qualquer repórter – brasileiro ou estrangeiro – minimamente informado verá que não há nada de fascista em recorrer ao ordenamento jurídico brasileiro, que prevê a remoção de um presidente em caso de crime de responsabilidade, do qual há evidências mais que suficientes no caso de Dilma Rousseff.

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E, se os repórteres que entrevistaram Dilma ainda precisarem de alguma ajuda, contarão com Carmen Lúcia e Dias Toffoli, ministros do Supremo Tribunal Federal que, na quarta-feira, deixaram muito claro que não há golpismo algum em curso. “O processo de impeachment é previsto na Constituição e nas leis brasileiras. Não se trata de um golpe, todas as democracias têm processos de controle, e o impeachment é um processo de controle”, disse Toffoli, ex-advogado do PT. Carmen Lúcia ainda afastou as acusações de politização e ativismo judicial na Lava Jato: “Estão sendo observadas rigorosamente a Constituição e as leis”, cravou.

Com uma tentativa tosca de enrolar a imprensa internacional e o uso político dos canais do Itamaraty, só o que o governo consegue fazer é dar escala global ao vexame protagonizado por Dilma Rousseff.