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Em 12 de março deste ano, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que tinha acabado de ser citado na lista de investigados da Operação Lava Jato, se apresentou espontaneamente à CPI da Petrobras e foi enfático: “Não tenho qualquer tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu imposto de renda”. Mas essa história começou a ruir em setembro, quando o Ministério Público da Suíça enviou a autoridades brasileiras documentação sobre contas bancárias em nome de Cunha e de familiares no país europeu. O dinheiro nessas contas seria fruto da pilhagem na Petrobras, investigada pela Lava Jato. Desde então, o cerco contra o presidente da Câmara se intensificou e, na tarde de quarta-feira, dia 28, o Conselho de Ética recebeu representação (protocolada pelo PSol e pela Rede Sustentabilidade no dia 13) contra Cunha por quebra de decoro parlamentar.

A reação começou imediatamente. Cunha aprendeu direitinho com o PT, que nesses 12 anos de poder deixou claro que o vale-tudo está liberado e que os fins justificam os meios. Aliados do presidente da Câmara estão levantando informações sobre membros do Conselho de Ética da casa, na tentativa de constrangê-los ainda antes da reunião da próxima terça-feira, que deve marcar o início formal do processo dentro do conselho e que pode culminar com a cassação de Cunha.

Se a bancada do PT não tem pudor de aliviar para Cunha, deveria ser a oposição a primeira a encampar de forma explícita a bandeira de sua saída

Cunha não tem condições políticas, e muito menos morais, de permanecer no cargo. Por muito menos, outros presidentes das duas casas do Legislativo federal já tiveram de deixar o posto. Em setembro de 2005, Severino Cavalcanti renunciou não apenas à presidência da Câmara, mas também ao próprio mandato, envolvido no “mensalinho”, uma cobrança de propina de R$ 10 mil mensais feita ao dono de um dos restaurantes da Câmara. Em 2007, Renan Calheiros escapou por pouco da cassação de seu mandato de senador, mas acabou renunciando à presidência da casa após denúncias de repasses de empreiteiras a uma ex-amante e de que ele seria o verdadeiro dono de alguns veículos de imprensa, usando laranjas para ocultar a propriedade. As acusações que pesam contra Cunha superam aquelas que derrubaram Cavalcanti e Calheiros. Se ele ainda permanece no cargo, temos um sintoma evidente da degradação moral que se espalhou pela política nacional com ainda mais força a partir de 2003.

O que causa tanta ou maior perplexidade que o apego de Cunha ao cargo é a inércia da oposição no Congresso. PSDB, Democratas e outras legendas de oposição à presidente Dilma Rousseff cortejaram Cunha até onde foi possível (ou, nos momentos mais críticos, simplesmente se omitiram), baseados na crença de que apenas ele seria capaz de levar adiante os pedidos de impeachment que aguardam um posicionamento do presidente da Câmara. Mas, com isso, não conseguiram muito mais do que se tornar cúmplices das ações do deputado, que ainda por cima passou a pender mais para o lado do governo, um jogador com poder de “persuasão” bem maior que os oposicionistas.

É bem sabido que o PT, que tem três dos 21 integrantes no Conselho de Ética, vem agindo nos bastidores para preservar Cunha, num “acordão” costurado principalmente pelo ex-presidente Lula. Foi muito sintomático o fato de apenas metade da bancada petista na Câmara ter assinado o pedido do PSol e da Rede. Nada surpreendente, pois a cúpula do partido é mestre em abraçar antigos inimigos e “limpar” sua reputação: foi assim com Paulo Maluf, com José Sarney e com Calheiros. Por que não poderia sê-lo com Cunha?

Pois, se a bancada do PT não tem pudor de aliviar para um presidente da Câmara afundado em acusações, deveria ser a oposição a primeira a encampar de forma explícita – e não com a timidez de alguns líderes partidários – a bandeira da saída de Cunha. Ao não fazê-lo, a oposição passa atestado de conivência e entrega de bandeja a plataforma da ética na política a partidos de extrema-esquerda com projetos tão ou mais prejudiciais ao país quanto o do PT, que começou sua ascensão justamente apoiado no discurso da honestidade para, no fim, ver seus líderes se mostrarem predadores ainda mais vorazes dos recursos públicos e depredadores contumazes das instituições.

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