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editorial

Esperança para a Venezuela

Apesar das irregularidades; apesar da massiva propaganda governista na mídia estatal, veiculada até mesmo no dia da eleição; apesar da mudança arbitrária do horário de fechamento das urnas; apesar do cerceamento de observadores internacionais independentes; apesar do encarceramento de líderes oposicionistas e da proibição de que outros se candidatassem, o chavismo sofreu uma derrota amarga nas eleições legislativas venezuelanas deste domingo. Quase 75% dos eleitores compareceram às seções eleitorais e deram a maioria parlamentar à oposição, que até o momento tem 99 cadeiras, contra 46 dos governistas de Nicolás Maduro – são 167 cadeiras em disputa, das quais 22 ainda estão indefinidas por se tratar de zonas eleitorais em locais remotos ou nas quais houve votação manual. O resultado final é importante porque, se a Mesa da Unidade Democrática (MUD, a coalizão oposicionista) conseguir 100 deputados, terá a chamada “maioria qualificada”, com poderes adicionais; se chegar a 111 cadeiras, poderá inclusive convocar uma nova Assembleia Constituinte.

O chamado “socialismo do século 21” acaba tendo os mesmos resultados do socialismo do século 20

O eleitorado venezuelano parece ter percebido que o chamado “socialismo do século 21” acaba tendo os mesmos resultados do socialismo do século 20: pobreza, escassez de recursos básicos, fim das liberdades democráticas (apesar da manutenção de eleições periódicas), culto à personalidade, imprensa amordaçada, economia fora de controle, violência nas ruas, acirramento das hostilidades entre diversos grupos sociais. O chavismo, com sua política de expropriações, destruiu o setor produtivo privado e acreditou ser capaz de manter a população satisfeita apoiando-se exclusivamente nas divisas obtidas com a venda de petróleo. Quando o preço da commodity caiu, o país descobriu o alto custo da luta levada a cabo contra o empresariado local, com as prateleiras vazias nos supermercados, a inflação galopante e um Produto Interno Bruto que deve cair 10% em 2015 e 6% em 2016, segundo previsão do Fundo Monetário Internacional – o pior desempenho na América Latina.

No entanto, é cedo para saber até que ponto esse novo Congresso será capaz de mudar a Venezuela, um país onde os poderes do Executivo ainda são desproporcionais em relação aos do Legislativo e do Judiciário – e não se pode esquecer que o sistema judicial venezuelano ainda é extremamente submisso ao chavismo. Além disso, as milícias chavistas e o aparelhamento de diversas outras instâncias da sociedade civil serão obstáculos formidáveis à implantação de um programa oposicionista.

O grande desafio dos parlamentares da MUD será demonstrar – na medida do possível, já que boa parte das decisões continua a ser tomada por Maduro – que é possível cuidar dos interesses dos mais pobres sem aderir ao populismo de esquerda. O chavismo só encontrou terreno fértil para prosperar entre as classes mais desfavorecidas na Venezuela graças ao descaso com que elas vinham sendo tratadas pelos governos anteriores, ainda que eles tivessem compromisso com as liberdades democráticas; as misiones chavistas ofereceram saúde e educação a uma parcela da população que não tinha acesso a esses bens.

Os venezuelanos, que entregaram a maioria no seu Legislativo à oposição; e os argentinos, que elegeram Mauricio Macri para a presidência, encerrando mais de uma década de kirchnerismo, enviam uma mensagem positiva para toda a América Latina: por mais sedutor que seja o populismo, ele não pode ser a solução para o continente.

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