A concessão de reajustes para parte do funcionalismo público federal pelo governo interino está cobrando seu preço. Pressionado para aprovar mais aumentos, ao mesmo tempo em que precisa convencer o Congresso a votar as medidas do ajuste fiscal, o presidente Michel Temer (PMDB) se tornou vítima de suas contradições. Diz à imprensa que é hora de os reajustes cessarem, ao mesmo tempo em que se colocou em uma situação em que não consegue evitar que eles ocorram. O resultado é um arranhão na base governista.

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A série de reajustes começou errada. Logo ao assumir, a equipe de Temer anunciou que a União teria um déficit de R$ 170 bilhões neste ano. O rombo fez com que o Ministério da Fazenda apresentasse um projeto de lei instituindo um teto para o gasto público, uma ferramenta poderosa de redução do gasto no médio prazo. Mesmo nesse contexto, a base de Temer aprovou em uma única noite, no fim de junho, aumentos para 14 categorias, a um custo de R$ 50 bilhões até 2020.

O apoio do governo a esses projetos abriu uma temporada longa de outras negociações. Categorias que ficaram de fora, como os defensores da União, os ministros do Supremo Tribunal Federal, auditores da Receita e policiais federais esperam que seus pedidos também sejam atendidos.

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Essas negociações coincidem com o momento em que Temer começa a pedir votos para o projeto de ajuste fiscal proposto por Meirelles, o que fez rachar a base de apoio do governo. PSDB e DEM não querem votar os aumentos, a começar pelo reajuste do STF, que tem efeito em cascata – é balizador para os salários do Judiciário nos estados.

O desconforto com a base esquentou na última semana, quando o PSDB se opôs publicamente ao aumento do STF. Membros da equipe de Temer vieram a público para dizer que não era o momento para mais reajustes, mas não convenceram. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), marcou para 8 de setembro a votação do texto sobre o salário do Supremo e a correção dos vencimentos dos defensores públicos da União foi aprovada pelos senadores na quarta-feira (24) – sem os votos de PSDB e DEM.

O desgaste provocado pelos aumentos do funcionalismo, portanto, é grave e pode se aprofundar já que novas concessões são quase inevitáveis. O governo ficou com poucos argumentos para negar o reajuste aos ministros do STF, cujos vencimentos ficaram defasados em relação a outras carreiras, e passará a ser pressionado por outros grupos de servidores.

O governo fez o pior tipo de cálculo político quando soltou a rédea que segurava os reajustes. Concedeu benefícios em troca da pacificação da relação com parte do funcionalismo, na expectativa de que isso contaria pontos na votação do impeachment. Assim, inverteu a ordem correta da boa gestão. Em vez de colocar as contas em dia para depois gastar, elevou a despesa sem ter assegurado o ajuste fiscal.

Temer terá de mudar de postura e recuperar o controle do jogo com grupos de interesse para não frustrar as expectativas de que entregará, até o fim do ano, a perspectiva que vendeu no início de sua gestão: déficit em queda, inflação sob controle e retomada da confiança na economia. Ele parece já ter escolhido suas prioridades: o teto de gastos e a reforma da Previdência. É o caminho correto e que poderá dar sustentação às aspirações de crescimento do Brasil.

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