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editorial

Um zumbi tributário

É assustadora a capacidade do governo federal de tentar tirar mais dinheiro da população em um dos piores momentos da vida econômica nacional, quando pessoas e empresas estão amargando forte recessão, queda nos lucros, diminuição da renda familiar, inflação em alta e empobrecimento visível. Assustadora também é a incapacidade do governo de reduzir o inchaço da máquina pública e seus privilégios.

A situação fica pior diante de uma carga tributária efetivamente arrecadada – já que a carga nominal é muito maior –, correspondente a quase 37% do Produto Interno Bruto (PIB), e que não para de crescer, com os tributos aumentando em todos os anos. Vários reajustes já foram realizados em 2015 e, mesmo assim, o Palácio do Planalto tentou ressuscitar a malfadada CPMF – o chamado “imposto do cheque” – e pretende elevar o imposto sobre herança e o imposto sobre doações, além da intenção de criar um imposto sobre grandes fortunas.

Chega a ser estranho que o governo Dilma Rousseff se disponha a seguir por esse caminho poucos dias depois de haver aumentado a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 15% para 20% sobre os lucros dos bancos. Parece que o governo não consegue entender que banco não paga imposto algum; tudo acaba transferido para as pessoas e as empresas que tomam empréstimos. Pois mesmo assim a ideia de recriar a CPMF está posta – apesar de, neste momento, o governo ter decidido por um recuo tático temporário, graças ao risco de elevar perigosamente o grau de irritação da população no momento em que todos, menos o governo, estão apertando duramente suas contas.

A carga tributária brasileira bateu no teto e está prejudicando o dinamismo da economia

A CPMF deixou de ser cobrada em 2007, mas se mostra um zumbi difícil de exterminar definitivamente. Usando um argumento aparentemente nobre – trazer mais dinheiro para o sistema de saúde –, o governo volta e meia tenta recriar o imposto. Houve tentativas em 2008 e 2011; a nova proposta, que durou até a semana passada, era impor a alíquota de 0,38% sobre as movimentações financeiras a fim de arrecadar em torno de R$ 80 bilhões em 2016 (o equivalente a 1,3% do PIB). Diante da tragédia financeira que se abateu sobre o orçamento do setor público – uma consequência da recessão causada, a bem dizer, pelos erros do próprio governo –, o sistema governamental deveria também participar do sofrimento já imposto às pessoas e às empresas, reduzindo a máquina pública e cortando privilégios.

Além de todos os males causados à economia por mais impostos em momento recessivo, é preciso lembrar que, quando a manutenção da CPMF, proposta pelo governo Lula, foi rejeitada em 2007, vários aumentos tributários foram feitos para compensar a derrota. Na época, se aprovada, a CPMF daria em torno de R$ 40 bilhões por ano ao governo. Com a reprovação da proposta no Congresso, o governo aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), elevou a CSLL sobre o lucro dos bancos de 8% para 15% e mexeu em outros tributos, e a arrecadação foi aumentada em R$ 21 bilhões. A CPMF não foi recriada, mas o governo fez aumentos tributários equivalentes a metade da CPMF. Portanto, não é verdadeira a afirmação de que o orçamento público perdeu R$ 40 bilhões.

O governo Dilma tentou a artimanha de propor a recriação da CPMF com repasse de 10% do total arrecadado (em torno de R$ 8 bilhões) para estados e municípios. O governo Dilma queria apenas o apoio político de prefeitos e governadores por meio de pressão sobre seus deputados para votarem a favor do novo tributo. A população dá sinais de ter esgotado sua tolerância com aumentos na carga tributária, que ameaça atingir os 40% do PIB, e com o fato de que o governo age como se somente pessoas e empresas devessem pagar o preço da crise e do desequilíbrio financeiro do setor público.

Mesmo que, neste momento, a ideia de recriar a CPMF tenha sido posta de lado pelo governo em razão da possível rejeição no próprio Congresso, o projeto não foi abandonado completamente. Em algum momento futuro, a proposta vai voltar pelas mãos do atual governo ou dos próximos, transformando a CPMF num zumbi que insiste em não morrer e periodicamente volta a assombrar a sociedade. A questão essencial se resume a dois pontos. Primeiro, a carga tributária brasileira bateu no teto e está prejudicando o dinamismo da economia. Segundo, o governo é parte da sociedade e também deveria participar dos sacrifícios diante da gravidade da crise, em vez de tentar enfiar a mão pesada no bolso do povo para cobrir os rombos dos tesouros públicos.

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