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Damasco, Aleppo, Homs, Latakia são cidades que viveram a transição da Idade da Pedra para as do Bronze e do Ferro. Enquanto a América do Sul ainda era deserta, lavouras e mercados agitavam as pessoas que construíram as primevas urbes da história. Ali, no crescente fértil, domesticaram-se animais e vegetais que permitiram o sedentarismo; o caçador-coletor passou a ser agricultor e pecuarista. Ao gerar excedente de produção, surgiu a necessidade de registrar e controlar estoques. A escrita foi uma das decorrências desse momento capital na jornada humana. A civilização começou nessas ruas e casas que são palco de guerra fratricida.

De certa forma, essa violência é parte do que somos e vê-la assim tão crua faz a alma lacrimejar ao toque do silêncio. Guerra faz parte da condição humana, mas isso não significa que devamos nos acostumar a ela. Sábios a discutem (Sócrates e Platão, Einstein e Freud) e produzem conclusões idênticas às das pessoas comuns, quais sejam, a guerra é sempre ruim, porém em algumas circunstâncias pode ser justa, mal necessário. Na Síria a sensação é de mal desnecessário, evitável. Contudo, almas compungidas compreendem os acontecimentos. Chorar não ajuda a explicar a guerra e imobiliza a ação racional para, dentro das limitações inerentes a essas situações, mitigar os danos.

Em perspectiva local, os sírios têm atritos autóctones gerados pelas divisões religiosas dentro do Islã. Da mesma maneira que cristãos se mataram a pretexto de que um rito cristão é mais adequado que outro, os muçulmanos o fazem, além da agressividade com pessoas e povos de outras religiões. Diga-se, violência oriunda de divergência religiosa é típica do monoteísmo.

A guerra civil na Síria ganha importância além-fronteira quando a eventual queda do governo encabeçado por Bashar al Assad é examinada em face dos interesses de Irã, Rússia, China, grupos paramilitares no Líbano e o Hamas, que governa a Faixa de Gaza. O Irã se autoassume como república islâmica do rito xiita – diferente do sunita, adotado pela maioria dos islâmicos de outros países. Em tosca analogia, a diferença entre protestantes e católicos.

Quando os Estados Unidos destruíram o Iraque, vizinho e então adversário do Irã, deram azo a que xiitas do Iraque assumissem o governo e se aliassem ao Irã, mudando a correlação de forças entre xiitas e sunitas na comunidade islâmica. Infelizmente, é forçoso reconhecer, a democracia na América não foi capaz de impedir a agressiva idiotia do governo Bush. Os Estados Unidos serviram como capangas do Irã, dando uma sova no governo sunita do Iraque representado por Saddam Hussein.

A Síria governada por Assad está em posição estratégica para o Irã controlar a Arábia Saudita, o Líbano e a Jordânia, além de mirar a fronteira israelense nas colinas de Golan. O Irã e seus atuais guarda-costas (Rússia e China) não medirão consequências para impedir que sunitas tomem o poder sírio. Pense globalmente, mate localmente. Os sírios se tornaram peças do xadrez político jogado por titãs.

A construção do mundo começou na Síria e parece ruir antes de estar pronta.

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