Uma decisão da Justiça – que condenou o governo do Paraná a indenizar um delegado que trabalhou por mais de dois anos com colete balístico vencido – fez com que centenas de policiais se articulassem para também ingressar com ações contra o Estado. Duas associações policiais – a dos Delegados do Paraná (Adepol) e a dos Praças da Polícia Militar (Apra-PR) – foram procuradas por seus representados para prestar assessoria jurídica nas ações indenizatórias. O caso dos coletes vencidos veio à tona em 2016, quando uma operação policial localizou 11,2 mil equipamentos que passavam por um “recall”, posteriormente considerado irregular.
A condenação do governo do Paraná foi confirmada pela 4ª Turma do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) em novembro do ano passado. A ação foi movida por um delegado da região de Londrina, no Norte do Paraná, que alegou ter trabalhado por dois anos e quatro meses usando um colete vencido. Por causa disso, a Justiça determinou que ele fosse indenizado em R$ 5 mil. O governo do estado recorreu da decisão.
“O dano moral restou caracterizado ante comprovação de que o autor utilizou o equipamento de proteção individual com prazo de garantia expirado por mais dois anos, fato que colocou em risco a sua integridade física”, destacou a juíza Camila Henning Salmoria, relatora do caso.
LEIA MAIS: Sesp “improvisa” com celas modulares para presos em terreno de delegacia
Segundo a Adepol, outras mais de 40 ações indenizatórias individuais estão sendo preparadas por delegados, com assessoria jurídica da associação ou de escritórios parceiros. O diretor-jurídico da Adepol, Pedro Felipe de Andrade, destaca que a maioria dos mais de 400 delegados do estado pôs a vida em risco, ao trabalhar em com os coletes balísticos vencidos.
“Felizmente, o Poder Judiciário começa a reconhecer aquilo que já denunciávamos há muito tempo: a omissão irresponsável do governo, que com sua costumeira incompetência e falta de planejamento colocou em flagrante e iminente risco a vida de milhares de policiais civis e militares”, disse. “Já temos mais de 40 ações em trâmite e agora esse número só tende a aumentar”, completou.
Na PM
O volume de ações deve ser bem maior na Polícia Militar (PM), que tem efetivo de mais de 18 mil servidores no estado. De acordo com a Apra-PR, mais de 100 ações se encontram em fase de elaboração, com apoio jurídico da associação. A expectativa é de que esse número aumente rapidamente. “Devem entrar 50 novas ações por semana, em média. Vai ser muita ação”,estimou o presidente da Apra-PR, Orélio Fontana Neto.
Ele destaca que quando o “recall” dos coletes vencidos veio a público, a associação orientou os policiais a documentar que estavam com equipamento de segurança fora do prazo de validade. Por isso, ele acredita que seja fácil para os policiais comprovarem que estavam em risco.
“Na época, nós fizemos uma campanha, pedindo que os policiais militares nos enviassem um documento com a data de fabricação e o número de colete. Tivemos centenas de casos documentados”, destacou Fontana Neto.
A Apra-PR afirma que, ainda hoje, o número de coletes é insuficiente e há policiais trabalhando com o equipamento com prazo expirado. A associação apresentou à reportagem fotos de vários coletes vencidos e que ainda estariam em uso. Um destes teve a validade expirada em fevereiro do ano passado - há quase um ano. “Hoje, ainda faltam oito mil coletes. O policial trabalha e deixa o seu colete no quartel, para revezar com o outro policial da escala. Infelizmente, a situação é essa em todo o estado”, disse.
Outras associações minimizam o caso
Outra entidade que representa policiais militares, a Associação dos Direitos dos Policiais Militares (Amai) acredita que o precedente aberto com a condenação do Estado não gere novas ações nos quartéis, exceto em casos pontuais. O diretor de comunicação da Amai, César Alberto de Souza, apontou que o problema dos coletes vencidos teria sido regularizado.
“Nossos coletes são usados diariamente, então o nosso pessoal não tem utilizado [coletes] vencidos”, disse. “Não devemos ter ações, a não ser um ou outro caso específico. Em todo caso, nosso departamento jurídico está à disposição do associado”, acrescentou.
O Sindicato das Classes Policiais Civis do Paraná (Sinclapol) informou que, até agora, nenhum agente procurou a entidade, pedindo orientação jurídica em eventuais ações em razão dos coletes vencidos. “Não houve o interesse entre os policiais civis. Quando chegaram os coletes novos, fizemos uma campanha de devolução dos coletes vencidos e entrega dos novos”, afirmou.
O que diz a Sesp
Por meio de nota, a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) informou que o governo do Paraná recorreu da condenação e, “por se tratar de um processo que ainda está tramitando”, não vai comentar o caso.
A Sesp apontou que está em tramitação o processo de compra de cerca de 10 mil novos coletes balísticos, “que irão reforçar a segurança da corporação em todo o estado”. A secretaria ressalta ainda que em 2016 foram adquiridos 8 mil coletes, já entregues a diversas forças policiais do estado. “Além disso, a Sesp recebeu recentemente, da Secretaria Nacional de Segurança Pública, 1.600 novos coletes balísticos”.
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
Quem são os indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado
Bolsonaro indiciado, a Operação Contragolpe e o debate da anistia; ouça o podcast
Seis problemas jurídicos da operação “Contragolpe”
Deixe sua opinião