A maior parte das pessoas só viu júris em filmes, novelas e séries e, dessas peças de ficção, é que tiram as impressões de como funciona um julgamento popular. Mas, na vida real, o trabalho dos jurados é bem diferente do que acontece nas telas. Não tem glamour. É demorado, bastante técnico e cansativo.
Uma das imagens equivocadas é de que o réu, caso seja condenado, é preso imediatamente após o anúncio do veredicto. Para aqueles que estão respondendo processo em liberdade – como é o caso do ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho, que vai a júri no dia 27 de fevereiro pelo envolvimento na colisão que matou Gilmar Yared e Carlos Murilo de Almeida, em 2009 –, há o direito de recorrer, solto, da decisão do julgamento.
Só saem presos do tribunal os réus que já estavam cumprindo alguma medida de restrição de liberdade antes do júri. Foi o caso de Alexandre Nardoni, em 2010, condenado pela morte da filha Isabela, em São Paulo. Alexandre saiu do tribunal em um camburão, direto para a penitenciária porque era lá onde já estava antes mesmo do julgamento, cumprindo prisão preventiva determinada anteriormente pela Justiça.
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Também não há algemas. Nem antes, nem durante nem depois do julgamento. Só em situações muito específicas, em que o aparato de segurança é insuficiente diante dos riscos, é que réus ficam algemados em júris. É que o uso de algemas pode influenciar os jurados, carimbando no acusado a pecha de culpado.
O criminalista Mário Soltoski Júnior explica que a visão estereotipada sobre júris vem de um modelo mostrado nos filmes norte-americanos. “Mas nem nos Estados Unidos é assim”. Ele comenta que a maior parte dos países democráticos prevê que a sentença possa ser revista por um colegiado. Ou seja, nenhum cidadão fica refém de um desafeto em particular, de uma decisão que foi tomada por uma única pessoa e leva a consequências imediatas. Sendo assim, a execução da pena depende da confirmação por um conjunto de, no mínimo, três magistrados. É o princípio de duplo grau de jurisdição.
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“O júri é soberano. Mas o tribunal de apelação analisa, entre outros aspectos, se há elementos que justificam anular a decisão e fazer um novo julgamento”, diz. O advogado e professor de Direito Penal reforça que não cabe aos magistrados analisar o mérito do que foi decidido pelos jurados, que são representantes do povo.
Para Soltoski, a vontade de ver alguém preso é parte de uma sanha justiceira, que enxerga que as decisões da Justiça são equivocadas porque protegem criminosos. “Mas essas mesmas pessoas não pensam na quantidade de acusados que terminaram inocentados. Qualquer um de nós pode ser vítima de uma injustiça. Para evitar isso, precisamos de regras que nos protejam de execuções sumárias”, avalia.
Surpresas
Outra impressão errada sobre julgamentos é de que provas de última hora ou testemunhas-surpresa podem aparecer, de repente. Na verdade, tudo o que defesa e acusação pretendem apresentar no júri já foi entregue até sexta-feira (23). Pelas regras jurídicas, as partes precisam ter acesso ao que será mostrado – para, por exemplo, alegar que é uma prova falsa, se for o caso. Assim, os vídeos que eventualmente serão transmitidos durante o júri já foram incluídos no processo.