O aumento de R$ 0,55 no valor da passagem de ônibus determinado pelo prefeito Rafael Greca (PMN) em fevereiro deste ano não fez aumentar a receita do sistema de transporte coletivo de Curitiba. A prefeitura ainda não fechou os dados da arrecadação relativa ao mês de maio, mas na comparação do bimestre março e abril com o mesmo período do ano passado, o crescimento nominal da receita foi de apenas 0,6%, a despeito do aumento de 14,9% do valor na tarifa.
Essa situação é consequência da intensificação da queda do número de passageiros no sistema de transporte coletivo. A quantidade de usuários já vinha caindo nos últimos anos, mas não de forma tão vertiginosa como a registrada neste primeiro trimestre após o reajuste que elevou a tarifa para R$ 4,25. O reajuste da tarifa foi justificado pelo prefeito como única forma de comprar ônibus novos e melhorar o sistema.
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Segundo dados do Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Setransp), o número de passageiros pagantes equivalentes – cálculo que exclui isenções e descontos – caiu 14% em 2017 na comparação com 2016. Isso equivale à perda de 7,6 milhões de passageiros em um intervalo de um ano.
Na avaliação do presidente da Urbs, José Antônio Andreguetto, a crise econômica é a principal responsável pela queda de receitas e passageiros. “O maior impacto que tivemos foi no carregamento do cartão-transporte. Quem carrega é o patrão; a queda maior está aí. São 14 milhões de desempregados no país, quanto menos empregados os patrões têm, menos vale-transporte carregam”, explicou.
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Para Andreguetto, o aumento no valor da tarifa pode ter contribuído para a diminuição de passageiros, mas não é a causa principal. “Tudo se soma, mas não é só o aumento em si. O patrão é obrigado a dar vale-transporte, independente do aumento”, afirma.
O urbanista Carlos Hardt, especialista em Gestão Urbana e professor da PUCPR, também aponta a crise econômica e o aumento da tarifa como os principais fatores que estão causando a evasão de passageiros.
Para o especialista, a retomada do número de usuários do sistema é improvável no curto prazo e depende da melhoria da qualidade dos serviços oferecidos. “Eu acho que a maior possibilidade de intervenção é, no médio prazo, investir na qualidade do transporte. Tentar fazer com que a comparação em termos qualitativos de um automóvel com o coletivo diminua. Para isso, há uma série de medidas que podem ser adotadas, como faixas exclusivas e tarifas de valores diferenciados em horários fora do pico”, afirma.
Já na avaliação do Setransp, o transporte urbano no país, atualmente, deixa a desejar em três pontos elementares: equilíbrio econômico-financeiro; qualidade dos serviços e tarifa justa. Em nota, o sindicato afirmou que a diminuição da velocidade média dos ônibus nos centros urbanos devido aos congestionamentos, o maior consumo de combustível, a perda de passageiros, expansão desmedida de gratuidades sem fonte de custeio e a concorrência com novos aplicativos de transporte nas cidades têm aumentado o custo do transporte coletivo e, consequentemente, o valor da tarifa.
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Tendência nacional
A queda de passageiros e o desequilíbrio financeiro dos sistemas de transporte coletivo não são exclusividade de Curitiba. Na visão do diretor administrativo e institucional da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Marcos Bicalho dos Santos, a crise no setor é nacionalizada e não é nova. Segundo ele, os congestionamentos urbanos, a carga tributária, o desemprego, a inflação e a crise econômica são fatores que marcam o contexto de degradação do setor.
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Leia a matéria completaPara a NTU, a solução passa por mudanças na forma de financiamento do sistema. De modo geral, a entidade defende que o transporte individual financie o transporte público. A proposta para isso é instituir uma contribuição sobre o preço do combustível pago pelos donos de veículos particulares, cujos recursos iriam para um fundo com destinação exclusiva para custeio do transporte coletivo.
“Do que adianta ter um serviço público essencial que não seja acessível à população? É uma questão que você não consegue equilibrar [...] A cada ano você aumenta a tarifa para compensar os aumentos causados pela inflação e pelos aumentos salariais, e melhoria de qualidade, nada; então temos que buscar alternativas”, argumenta Santos.