Os 86 anos de vida são suficientes para que Silvino Cândido, o Capixaba, não acredite em tudo o que ouve inclusive de que receberá um benefício de R$ 750 por mês. Questionado sobre o que fará com o dinheiro quando recebê-lo, o aposentado, que recebe pensão rural de um salário mínimo (R$ 380), afirma ser que nem São Tomé: só acredita vendo.
E isso não é sinal de ignorância. Pelo contrário. A desconfiança é de quem está muito bem por dentro dos assuntos do dia-a-dia nacional, fruto do relacionamento intenso do aposentado com o rádio, sempre ligado em uma das casas em que vive no hospital-colônia em Piraquara. "Quero só ver se o Lula vai mesmo me dar esse dinheiro", enfatiza o aposentado, que antes de chegar ao HDSP, em 1977, passou por outros dois hospitais-colônia.
A primeira internação foi com 14 anos, ainda no Espírito Santo. Mas os indícios da hanseníase já vinham de antes, dos 9 anos. "Um dia queimei os dois joelhos, mas só sentia dor de um lado." Cinco anos depois, quando surgiram as manchas pelo corpo, Silvino foi direto do posto de saúde para o isolamento. "Quando cheguei ao posto, já tinha um guarda na porta me esperando para levar", recorda-se. Ficou quatro anos e fugiu.
Em Minas Gerais, onde foi morar e se casou, a cena se repetiu. Do posto de saúde, Silvino foi para o hospital-colônia Santa Isabel, onde ficou 9 anos. Quando saiu, não conseguia emprego e perdeu contato com a esposa. "Ninguém queria me dar trabalho porque tinha hanseníase", recorda. O jeito foi recomeçar a vida longe, em Santa Lúcia, Oeste do Paraná.
Mas novamente o preconceito prevaleceu. Como não arranjava emprego, decidiu por conta própria vir para Piraquara em 1977, de onde nunca saiu. Descobriu que a esposa, que havia deixado em Minas, morreu em 1972 também vítima do mal de Hansen no mesmo hospital onde passou a viver. "Aqui eu não sou macaco para ninguém, ninguém fica me perseguindo por isso", explica, mostrando as mãos com dedos retorcidos e amputados, o porquê optou por viver no hospital-colônia.