O hoje empresário Wladimir Trombini, 74 anos, era ainda um garoto de calças curtas, estudante do Colégio Santa Maria, quando viu uma cena para não mais esquecer: uma manifestação de populares contra as sociedade Concórdia, Rio Branco e a Garibaldi. Aos 11 anos, podia não entender muito bem o que significava aquela ira toda, em pleno 1942, durante a Segunda Guerra, quando no Brasil inteiro pipocaram protestos contra as etnias do eixo Alemanha, Itália e Japão. Mas tratou de saber.
Passadas seis décadas, a figura de Wladimir e a da Garibaldi se confundem. Ele ficou 14 anos à frente da sociedade, está por trás do restauro do prédio neoclássico plantado na praça que leva o nome do visionário Giuseppe e, de quebra, escreve com a ajuda do fiel escudeiro Aírton Chamano, 53 anos, membro da diretoria da casa a história de uma das associações que mais obstáculos enfrentaram para se manter de portas abertas. No local que serviu de set de filmagem de Oriundi, longa-metragem de Ricardo Bravo e último trabalho do astro Anthony Quinn, o arranca-rabo de 42 é só um capítulo.
Tudo começa com a proibição, em tempos de monarquia, de eregir um busto em bronze em homenagem ao herói italiano Garibaldi. Era 1883. E diante do "não", os 420 sócios cujos sobrenomes estão em letra graúda num quadro dentro do prédio projetado por Ernesto Guaita decidiram fundar uma sociedade. Era mais do que preciso. "Os imigrantes vieram para colonizar o litoral e muitos foram trabalhar na construção da Estrada de Ferro Paraná Curitiba, para melhorar o orçamento. Prometeram riqueza àquela gente e muitos queriam voltar para a Itália. Poucos conseguiram", ilustra Wladimir.
Mais de uma vez a Sociedade Garibaldi um dos melhores pontos do Alto São Francisco virou objeto de cobiça. Durante a Revolução de 30, foi usada como presídio. Em outras ocasiões, como hospedaria elegante para políticos. Em 1942, tornou-se alvo de verdadeiras ocupações. Autoridades transferiram as atividades dos sócios para o depósito dos fundos liberando a área nobre para a Academia Paranaense de Letras sem falar no desplante do "Casa Olavo Bilac", escrito na fachada.
A briga pela devolução da sociedade demorou 20 anos e mobilizou tanto a comunidade italiana que virou uma novela de rádio da PRB2, em 1959. Na década de 60, quando a saga dos oriundi acaba, a Garibaldi já não era mais a mesma. Muitos dos 800 sócios tinham se filiado a outras agremiações, como a Urca, no Ahú. As avarias do prédio não suportavam uma "Tarantella" bem dançada no segundo piso. "Caía pó de cupim no povo aqui em baixo", diz Trombini.
Wlad, como é chamado, assumiu a encrenca em 1991, mandou ver no restauro e reforma do prédio, mas continuou amargando a ausência de mais filhos e netos de italianos para dar uma força na revitalização da Garibaldi. Atualmente, são 60 sócios 18 deles na diretoria. A mensalidade não passa de R$ 20 por mês, mais uma jóia de R$ 200. Seu protesto é duro. "Há 80 mil pedidos de dupla cidadania no Paraná e em Santa Catarina. Essa gente quer viver na Itália. Mas nunca veio até aqui."
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