Enterro de Bianca Rocha Tavares, na sexta-feira passada, uma das 12 crianças mortas por Wellington Menezes de Oliveira na escola de Realengo, no Rio de Janeiro. Motivações do crime devem permanecer um mistério, como em outros casos semelhantes| Foto: Ricardo Moraes/Reuters

Presos homens que teriam vendido arma

Estão presos, desde a noite de sexta-feira, dois homens apontados pela polícia do Rio de Janeiro como os responsáveis pela venda de uma das armas usadas por Wellington Menezes de Oliveira, autor do massacre de estudantes da Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro, na manhã de quinta-feira.

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Uma história, diferentes interpretações

As teorias para um atentado se acumulam na mesma proporção em que narrativas sobre o fato se acumulam nos veículos de comunicação. A tese, criada em 1988 pelo antropólogo norte-americano Karl Heider, é conhecida com efeito Rashomon. O nome é uma referência ao filme do diretor japonês Akira Kurosawa, realizado em 1951. Na trama, quatro personagens testemunham um crime e apresentam versões diferentes para o fato. Ao final, nenhuma prevalece como verdadeira, instigando o público a tirar a própria conclusão mesclando os relatos.

"A maioria das pessoas não experimenta os tiroteios como um fenômeno direto, e sim mediado pelos veículos de comunicação. Embora o problema persista ao longo da história, a cobertura intensa dos casos cria a percepção de que existe um problema social crescente", analisa, em artigo pu­­­­blicado no portal Inter Science, o sociólogo Glenn Muschert, coordenador do programa de criminologia da Universidade de Miami.

A psicóloga Cleia Oliveira Cunha, especialista em Psicologia Social e Jurídica, entende que a interpretação das notícias acompanha uma predisposição do espectador a absorver o fato de determinada maneira. "Uma pessoa carregando medo, que percebe a cidade como violenta, vai comprovar o quanto o mundo é perigoso. Uma audiência mais crítica vai ficar irritada com as afirmações expostas", diferencia.

Essa é uma reação que ocorre também com os cientistas. A psicopedagoga Maria Irene Maluf, consultora do Instituto Saber, da Escola Paulista de Direito, critica a patologização de alguns comportamentos complexos. "Leviana­­­mente, está se criando doenças para descrever a personalidade de crianças", comenta.

Em abril de 2009, nos dez anos do massacre em Columbine, cruzes foram colocadas em homenagem às 12 vítimas
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No início da tarde do dia 30 de dezembro de 1974, o estudante Anthony Barbaro, de 17 anos, entrou na escola secundária de Olean, no estado de Nova York (EUA), e acionou o alarme de incêndio. Os funcionários que correram para atender à suposta emergência foram recebidos a tiros pelo adolescente. Três morreram.

Trinta anos e quarenta ataques similares depois, os atentados contra escolas norte-americanas continuam a representar um quebra-cabeça em que falta uma peça. A forma de ataque, o perfil do agressor e o objetivo da ação formam um padrão recorrente, mas os motivos que levam um jovem a matar desconhecidos se perdem no momento em que, acuado, o perpetrador comete suicídio e sela o massacre.

Nos últimos três dias, a sociedade brasileira partilha a mesma busca por significado e prevenção, temendo que esse tipo de ação se torne um novo sintoma da crônica falta de segurança no país. Dependendo do narrador, a ação de Wellington Menezes de Oliveira – autor do massacre na escola de Realengo, no Rio de Janeiro – decorre da facilidade de acesso a armas, de deficiências no acompanhamento psicológico de crianças ou, ainda, da falta de porteiros adequadamente treinados em escolas públicas.

"É uma busca coerente. Todo episódio que nos impacta provoca perguntas sobre a natureza do fato. Indaga-se sobre o que a sociedade está fazendo com o ser humano, como o está influenciando", justifica a psicóloga Cleia Oliveira Cunha, especialista em Psicologia Social e Jurídica. "Pelo que temos percebido, esse é um fenômeno que dura mais ou menos uma semana. Não há educação para que a população seja crítica o suficiente para manter essas indagações", avalia.

Bullying

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As poucas informações disponíveis sobre Wellington apontaram a hipótese de bullying. Um estudante tímido e solitário, constantemente provocado e agredido por colegas, volta para "dar o troco", ainda que indiretamente, já que os 12 estudantes mortos não eram contemporâneos do agressor.

A socióloga Miriam Abramo­­vay, coordenadora da área de juventude da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), acredita que a tese é simplista demais para conseguir explicar a motivação do crime. "O bully­ing é um conceito muito incompleto, que a gente está usando sem saber direito o que é", opina.

Ela acredita que as motivações profundas de Wellington permanecerão ocultas. "A primeira questão a relevar é o fato de que se trata de um caso insólito, imprevisível. Nunca saberemos completamente a razão desse jovem de agir de tal ma­­­neira. O que está aparecendo são características de uma pessoa esquizofrênica e retraída. Mas, nessas horas, alguns estereótipos tendem a ser construídos", alerta.

Columbine

Nos Estados Unidos, o massacre na escola secundária de Colum­­­bine, no estado do Colo­­­rado, tornou-se referência para estudos sobre a relação entre convivência escolar e violência. Além da quantidade de mortos (12, o 4.º ataque mais letal dos EUA), o crime ocorrido em 1999 se sobressaiu também por ter sido uma ação conjunta de dois estudantes.

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Três anos depois, o Departa­­­mento de Educação e o Serviço Secreto dos Estados Unidos divulgaram o relatório Safe School Initiative (Programa Escola Segura), destinado a ajudar educadores a identificar ameaças em suas instituições de ensino. Pesquisando o perfil de 41 autores de ataques a escolas, o estudo ajudou a derrubar alguns mitos do assassino em massa.

De acordo com o levantamento, quase dois terços (63%) raramente ou nunca tiveram problemas disciplinares. Porém, 71% se sentiram perseguidos pelos colegas, e mais da metade (61%) tinha um retrospecto documentado de depressão ou desespero. Quatro em cada cinco tentaram cometer suicídio.

Pesquisadora do caso de Colum­­­­­­bine, Miriam percebe se­­­­melhanças entre esse caso e a tragédia carioca. "Havia um alvo selecionado. Os dois rapazes americanos até anunciaram na internet que iriam fazer aquilo. O que aprendemos em Colum­­­bine é que a escola deixou de ser um lugar de confiança dos alunos", analisa.

Ainda segundo o estudo norte-americano, em 81% dos casos havia outros estudantes que conheciam os planos do atirador. Em um caso paradigmático, relatado na pesquisa, o autor do atentado contou a dois colegas o que planejava fazer, e os aconselhou a permanecer no mezanino da escola, fora da linha de tiro. A notícia se espalhou, e no dia do ataque havia um total de 24 estudantes esperando o começo do ataque. Um deles portava uma câmera fotográfica.

Timidez clínica

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Já os psicólogos norte-americanos Bernardo Carducci e Kristin Nethe­­­ry, do Instituto de Pesquisa da Ti­­­­mi­­­dez, desenvolveram um conceito e o aplicaram aos mais recentes atiradores em escolas. A clinical shyness (timidez clínica) tem como sintomas apatia, baixa tolerância à frus­­­tração, ataques de raiva, rejeição social, relações familiares ruins e acesso a armamentos. Aco­­­meteria principalmente jovens do sexo masculino, e poderia levar a comportamento violento.

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Interatividade

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