Um adolescente de 16 anos acusou nesta quinta-feira (6) um grupo de cinco militares da 9ª Brigada de Infantaria Motorizada de espancamento e tortura com choques elétricos. De acordo com o jovem, o grupo também ateou fogo em seu corpo, ontem (5), em uma unidade desativada do Exército, na Rua Professor Carlos Venceslau, em Realengo, zona oeste do Rio de Janeiro. De acordo com J.S.G., a ação teria sido uma punição por ele estar fumando maconha em área militar.

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"Sei que eu estava errado, mas me barbarizaram", disse hoje o adolescente, que está internado no Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Pedro II, em Santa Cruz, com queimaduras de primeiro e segundo graus nas pernas, braços e rosto. O globo ocular esquerdo foi atingido por um líquido ainda não identificado, mas os médicos garantem que ele não corre risco de morrer ou de perder a visão.

J. contou que foi impedido de ver as identificações que os militares normalmente usam na farda, mas seu depoimento à 33ª Delegacia de Polícia Civil de Realengo já permitiu ao comando da 9ª Brigada de Infantaria identificar a guarnição que abordou o rapaz e um outro homem que consumia entorpecentes no local.

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Em nota, o Comando Militar do Leste (CML) apresenta uma outra versão. Segundo o Exército, uma patrulha usou spray de pimenta para deter dois invasores, que teriam tentado fugir. Eles teriam sido presos e liberados por volta das 16h. A nota afirma que outros militares e civis presenciaram o fato. Um Inquérito Policial Militar (IPM) foi instaurado. A 33ªDP informou que o caso foi transferido para a Polícia Federal, que até hoje não havia recebido o inquérito.

No hospital, J. disse que foi flagrado pela guarnição junto com um outro homem e não tentou fugir. Os militares mandaram os dois olharem para o chão. Segundo ele, a guarnição teria feito contato por telefone com um tenente. "Eu ouvi o tenente responder `dá três minutos para eles sumirem daí ou vou aí e mato eles'. Em seguida, eles liberaram o outro rapaz que tinha 23 anos, porque acharam que ele era menor e mandaram que eu ficasse", contou o adolescente.

De acordo com o relato de J., os militares agiram com frieza durante a tortura. "Eles não me xingaram, apenas me davam tapas. Eu olhava para o chão e logo senti no corpo um líquido que ardia. Acho que era um spray. Depois vieram os choques. No final, me tacaram fogo e me mandaram correr", descreveu.

O adolescente reconheceu para a família que é usuário de maconha há um ano, desde a época em que largou os estudos na quarta série. "Ele saiu de casa dizendo que ia jogar bola. Voltou quase nu aos berros e entrou direto no chuveiro, contou a dona de casa, Maria Célia Furtado, de 57 anos, que adotou J. aos três anos quando ele foi abandonado pela mãe. Ajudada por vizinhos, ela o levou para o Hospital Albert Schweitzer, em Realengo, onde o menino recebeu os primeiros socorros e foi transferido para o Hospital Souza Aguiar, no Centro, para uma avaliação oftalmológica. Com dores, ele foi internado hoje no Pedro II. "O corpo ainda dói muito, mas minha preocupação é com meu olho", lamentou J.

A Comissão de Direitos Humanos OAB-RJ afirmou que vai cobrar explicações do Exército sobre o caso. Familiares de J. afirmam que devem entrar com um pedido de indenização contra a União. Na sala de espera, enquanto ouvia os gritos do filho adotivo durante a troca de curativos, Maria Célia lembrou o caso do jovens favelados entregues por militares a traficantes de um morro rival em junho. " Quando via a história dos rapazes do Morro da Providência pensei que isto nunca aconteceria comigo. Sou evangélica e vivo para a Igreja. Será que estas pessoas não tem coração?"

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