A cirurgiã dentista Marcela Penteado e o paciente Wellington Moreira Júnior testam o aplicativo| Foto: Marcus Ayres/Gazeta do Povo

Algo visto como comum por muitas pessoas, procurar um dentista para tratar de uma dor de dente ou para fazer algum procedimento estético é um grande desafio para o comerciante Wellington Moreira Júnior, de 20 anos. O som da broca que assusta tanta gente não é o problema para ele. Deficiente auditivo, o jovem sente dificuldades de explicar o que está sentindo e de entender o que o profissional está fazendo durante o atendimento.

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“É difícil a comunicação. Eu faço um pouco de leitura labial, mas como o dentista usa máscara, atrapalha” explicou, utilizando a Língua Brasileira de Sinais (Libras). O problema de Moreira Júnior não é algo isolado. Pensando nisso, estudantes e professores da Universidade Estadual de Londrina (UEL) desenvolveram um aplicativo, que promete revolucionar o processo de comunicação entre os cirurgiões dentistas e os pacientes com surdez.

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Chamado de Odontolibras, o programa surgiu de uma pesquisa de mestrado feita pela dentista Valéria Avelar. A ideia foi proposta pela sua orientadora, a professora Maria Celeste Morita, que é presidente da Associação Brasileira de Ensino Odontológico (Abeno). Segundo Maria Celeste, a criação do aplicativo foi motivada principalmente por dois movimentos: a busca de uma tecnologia para facilitar o acesso à odontologia e a criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que visa a inclusão social desse grupo.

Em linhas gerais, o app permite uma conversa entre dentistas e pacientes. Para isso, o programa conta com imagens que ilustram o que será feito na consulta, acompanhados de explicações por Libras. Apesar de não substituir totalmente o intérprete durante o tratamento odontológico, o software proporciona independência para a pessoa com deficiência auditiva, que pode enfrentar situações constrangedoras durante o tratamento.

Maria Celeste conta que, certa vez, uma paciente foi atendida no pronto-socorro da Clínica Odontológica Universitária (COU) da UEL, mas que houve problemas na comunicação. “O atendimento foi à base de mímica. Foi iniciado um tratamento de canal, mas ela não entendeu que precisava retornar. Com o trabalho pela metade, ela poderia perder esse dente”, explicou a profissional. Ela ressalta que o temor de não se fazer entender faz com que muitos surdos só procurem o dentista quando sentem dor, deixando de fazer um trabalho preventivo de saúde bucal.

Tradução para Libras

Apesar de parecer simples, o Odontolibras já vem sendo desenvolvido desde 2014. Para criar o aplicativo, o projeto também contou com apoio dos departamentos de Letras, Design Gráfico e Ciência da Computação da UEL.

Deficiência auditiva no Brasil

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem cerca de 9,7 milhões de pessoas com deficiência auditiva, conforme dados do Censo de 2010. Destes, 2 milhões possuem deficiência auditiva severa, sendo que 344,2 mil são surdos.

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Segundo Valéria, como não havia bibliografia na área ou qualquer experiência semelhante, foi necessário começar o trabalho “do zero”. Um dos maiores desafios do projeto foi transformar termos odontológicos para a linguagem dos sinais. “Tivemos que mergulhar no universo da Libras, pois a maior parte das expressões usadas na odontologia não tinha tradução para a linguagem dos sinais”, explicou.

As etapas do atendimento pelo Odontolibras

1ª) Acolhimento: consiste no primeiro contato entre dentista e paciente. Utiliza mensagens como: “Bom dia, como vai?” e “Entre, sente na cadeira”.

2ª) Anamnese: é a entrevista realizada pelo cirurgião-dentista antes dos procedimentos, que vai levantar informações sobre o paciente, como se ele tem diabetes, pressão alta, alergias, entre outros dados.

3ª) Prevenção: o profissional vai orientar o paciente como prevenir doenças bucais.

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4ª) Tratamento: o dentista vai explicar ao paciente todas as fases do tratamento.